A Vontade de El-Rei D. João Segundo

No atual contexto de economia global, as organizações têm necessidade de assegurar vantagem competitiva para terem um sucesso sustentável.

Luis Fonseca
9 de Novembro de 2014

A Vontade de El-Rei D. João Segundo

Qualidade e Gestão

No atual contexto de economia global, as organizações têm necessidade de assegurar vantagem competitiva para terem um sucesso sustentável. Numa perspetiva integradora das principais Teorias de Gestão (Fonseca, 2012), uma organização, para ser competitiva, deve:

• Escolher o setor/indústria em que vai atuar e qual o posicionamento competitivo que vai adotar (Porter, 1984);

• Dispor de competências e recursos distintivos que lhe permitam obter vantagens competitivas que, por sua vez, originarão resultados operacionais e criação de valor sustentável, com ênfase no conhecimento como recurso determinante para um desempenho superior (Barney et al., 1986, 1991, 2001);

• Assegurar a satisfação das diversas partes interessadas para a manutenção de resultados sustentáveis, incluindo o lucro (Teoria dos Stakeholders (Freeman, 1984).

O “Movimento da Qualidade” desde cedo se focalizou na melhoria do desempenho das organizações e na satisfação dos seus Clientes enquanto parte interessada determinante para o sucesso das organizações, enfoque que foi progressivamente alargado a outras partes interessadas.

De uma forma sintética, a Gestão da Qualidade assenta em “3 pilares”, cada um desenvolvido por diferentes autores e com diferentes destinatários, durante a década de 1980 e o início da década seguinte (Fonseca, 2012):

O primeiro dos “pilares” consiste nos trabalhos dos “gurus” da Qualidade, nomeadamente Crosby, Deming e Juran, os quais propuseram um conjunto de princípios, passos e recomendações que os gestores deveriam seguir para assegurar o sucesso das respetivas organizações através da evolução do controlo da qualidade para a gestão da qualidade e, finalmente, para a gestão da qualidade total (TQM – Total Quality Management).

O segundo dos “pilares”, que hoje goza de grande visibilidade internacional como consequência de haver mais de 1 milhão de organizações com os sistemas de gestão da qualidade certificados segundo a norma ISO 9001:2008, reporta-se às normas da série ISO 9000, publicadas em 1987 pela ISO com base na colaboração de especialistas de mais de 100 países. Estas normas são hoje reconhecidas como um instrumento relevante para a satisfação dos clientes e a melhoria contínua das organizações e, consequentemente, para a promoção da confiança e do desenvolvimento do comércio internacional.

O terceiro pilar enquadra os modelos de Excelência (ou prémios da qualidade), dos quais o modelo americano Malcom Baldrige (finais 1980) e o modelo europeu da EFQM (início 1990) são os mais divulgados, dirigidos à gestão de topo das organizações tendo como mensagem chave a abordagem à Excelência Empresarial como via para o sucesso sustentável.

Constata-se um esforço de aproximação entre estes três pilares, por exemplo, há consistência entre os ensinamentos dos “gurus” e os princípios da gestão da qualidade das normas da série ISO 9000 e os princípios da excelência do modelo da EFQM, além de que as três perspetivas defendem uma abordagem sistémica e a melhoria contínua.

Adicionalmente, fazem parte do “corpo de conhecimentos da Qualidade” as chamadas Ferramentas da Qualidade (básicas, intermédias e avançadas, de que os Diagramas de Pareto e Causa-e-efeito, as Cartas de Controlo Estatístico, o QFD e FMEA e o Planeamento de Experiência são exemplos. E também se reconhece a importância das “soft skills” tais como o Trabalho em Equipa, a Negociação e a resolução de Conflitos para o sucesso das abordagens da Qualidade.

Condições necessárias para o sucesso e a melhoria

Mas se os Modelos de Gestão e de Gestão da Qualidade são conhecidos e se as Ferramentas da Qualidade são de divulgação generalizada, porque motivo existem organizações que, dentro de uma mesma indústria, são muito mais bem sucedidas na respetiva aplicação e que obtém resultados significativamente melhores?

Na minha opinião, devido a 3 fatores (Fonseca, 2012):

- As motivações para a Qualidade (de um modo geral, quando a motivação interna é mais forte, isto é a vontade de mudar e melhorar é determinante relativamente à de obter apenas um certificado, os resultados tendem a ser mais favoráveis);

- A forma como as organizações interpretam e implementam os modelos e as ferramentas da qualidade (que não devem ser encaradas numa perspetiva isolada mas antes devem estar alinhadas e suportar a estratégia de negócio da organização);

- E, por último, a maior ou menor liderança do processo e vontade coletiva para a mudança e melhoria. É fundamental ultrapassar a resistência à mudança e a aversão ao risco e agir em conformidade. Só novas e melhores abordagens nos vão potenciar resultados superiores.

E é sobre a vontade de mudança que gostaria de deixar uma breve reflexão pessoal. Há organizações (e pessoas também) que assumem um papel de protagonista: apesar das dificuldades, o que podemos e devemos fazer para melhorar desde já o que está ao nosso alcance?

Outras assumem o papel de vítimas: esperam que a envolvente se altere e que outros resolvam os problemas por que estão a passar.

É indesmentível que a atual recessão económica representa uma séria dificuldade para muitas organizações. A procura de muitos produtos e serviços diminuiu, quer devido a uma queda na procura global, quer devido a problemas internos específicos de certos mercados.

 

Este ambiente desfavorável colocou muitas organizações numa situação complexa e financeiramente instável, pelo que as mesmas se viram forçadas a adotar estratégias de sobrevivência que passam por assegurar liquidez, procurar novos clientes com os produtos atuais ou com novos produtos e tentar manter os níveis de produção de modo a evitar uma espiral de cortes indiscriminados de custos, dispensa de pessoal ou encerramento de fábricas e linhas de produtos.

 

Mas essas estratégias de sobrevivência podem ser mais facilmente geridas e implementadas com sucesso em organizações que tenham sistemas de gestão robustos, com uma cultura de orientação para o cliente, eficiência e monitorização do desempenho dos processos e uma mentalidade de melhoria contínua e orientação para os resultados, tal como é prescrita pela abordagem da gestão da qualidade. E é numa situação de crise que a diferença entre organizações “melhores” e “piores” se torna mais evidente. É importante que além do objetivo imediato da sobrevivência, as organizações não percam de vista a necessidade de progredirem, criarem valor e se prepararem para aproveitar as oportunidades pós crise. Mas para isso há que ter vontade, ultrapassar a resistência à mudança e passar à ação.

 

 Conclusão

Em síntese, é necessário que a Qualidade e a Melhoria assentem numa liderança empenhada, na vontade coletiva e no alinhamento da ação na prossecução de objetivos comuns. E que tenhamos a coragem e a vontade do homem do leme ao enfrentar o Mostrengo da Mensagem de Fernando Pessoa:

“Aqui ao leme sou mais do que eu:

Sou um Povo que quer o mar que é teu;

E mais do que o mostrengo, que me a alma treme

E roda nas trevas do fim do mundo,

Manda a vontade que me ata ao leme,

De El-Rei D. João Segundo”.

Newsletter Start&Go

Newsletter Start&Go