Nos jornais, na televisão, em revistas, na Internet, vemos vários especialistas de diferentes áreas profetizarem sobre o que vai mudar, qual vai ser o impacto da pandemia na vida quotidiana, na economia, na política e em muitos outros domínios científicos e sociais.
Apesar de tudo o que se diz e se escreve, e sem menosprezar qualquer análise ou perspetiva a respeito, parece que a resposta será simples e óbvia: não sabemos!
Conseguiremos, no entanto, com relativa facilidade e com maior ou menor grau de aprofundamento, dizer “o que influenciará o depois?”. E neste caso será quase um lugar-comum afirmar que a resposta mais básica e agregadora é: o que aprendemos!
Frei Raniero Cantalamessa, na sua pregação de Sexta-feira
Santa, a partir da Basílica de São Pedro, em Roma, lançou o que pode ser considerado uma espécie de
mote à explicitação desta resposta abrupta: “a pandemia de corona vírus despertou-nos bruscamente do perigo maior que os indivíduos e a humanidade sempre correram, o do delírio de omnipotência”. Aprendemos que não podemos tudo e
aprendemos que todos precisamos de todos.
1. Aprendemos que o desenvolvimento e o crescimento económico são produto do esforço coletivo da sociedade, das empresas, das organizações sociais e dos serviços do Estado, e que qualquer desequilíbrio que afete a paz social ou algum dos agentes deste sistema poderá ser rastilho para o colapso.
2. Aprendemos que, não obstante questões ideológicas ou políticas, temos ao nosso serviço um Estado que tem a missão de ser suporte, âncora e alavanca da sociedade e que, por essa razão, devemos no nosso dia-a-dia, não só enquanto contribuintes, mas acima de tudo como cidadãos responsáveis e empenhados, contribuir para o seu robustecimento e para a sua vitalidade.
3. Aprendemos que o tecido empresarial e produtivo, além de motor nuclear do sistema económico, é fonte de sustento das famílias e garante da autonomia e da soberania do país, sendo, por isso, fundamental a aposta na sua fortificação e o incentivo à sua expansão e diversificação.
4. Aprendemos que Portugal é detentor de um setor social e solidário singular, feito de instituições que, cobrindo todo o território, protegem e apoiam continuadamente, sem dar muito nas vistas, as crianças, os jovens, os cidadãos com deficiência, os idosos e as pessoas mais vulneráveis, e que, por essa razão, são merecedoras do nosso acarinhamento e envolvimento coletivos.
5. Aprendemos que, apesar da importância de todas as atividades profissionais, os médicos, os enfermeiros, os técnicos e auxiliares de saúde, os bombeiros, as forças de segurança e os trabalhadores das IPSS assumem um papel fulcral nas comunidades, lutando direta e diariamente pela salvação e manutenção da dignidade da vida dos cidadãos, expondo-se a riscos e perigos inimagináveis e fazendo, não raras vezes, sacrifícios pessoais muito duros.
6. Aprendemos a viver em e com a família, a conhecer melhor quem está ao nosso lado e a compreender a importância das cedências nas relações para podermos contar com contextos familiares harmoniosos e, a partir deles, sermos agentes de felicidade para nós próprios e para todos aqueles com que nos relacionamos dentro e fora de casa.
7. Aprendemos a dar mais valor a tudo: aos afetos, à proximidade, à família, aos amigos, aos colegas, às conversas, ao trabalho, à educação, à religião, à cultura, aos hobbies, à tecnologia, à vida em sociedade...
Face a tudo o que aprendemos, podemos estar certos de que o depois não será igual ao antes. Não seria sequer desejável que fosse. Para já é certo que poderemos ter esperança numa regeneração do paradigma social que resultará, em primeira instância, de uma maior intensidade na vivência de cada momento por cada pessoa.