PAUPÉRIO – 140 anos de biscoitos portugueses

É em pleno centro de Valongo, uma cidade onde as padarias e as biscoitarias são História desde o século XIX, que se encontra a Fábrica Paupério,

Maria Manuel Guimarães
24 de Março de 2017

É em pleno centro de Valongo, uma cidade onde as padarias e as biscoitarias são História desde o século XIX, que se encontra a Fábrica Paupério, um dos principais “pontos doces” tradicionais desta terra. Foi em 1874, precisamente há 141 anos, que nasceu a Paupério – uma padaria na altura em que Valongo era o principal fornecedor de pão à cidade do Porto, justificado pela necessidade de assegurar a elevada procura desta cidade. Quando esta passou a ser mais auto-suficiente, pela autonomia que o Porto foi tomando neste setor, a fábrica Paupério reconverteu-se para o fabrico de biscoitos, vindo a especializar-se na biscoitaria tradicional.

A sua gama de biscoitos foi-se alargando à medida que se especializavam nas receitas e nas técnicas para a sua produção, chegando a ter cerca de 40 variedades – fivelas, fidalguinhos, mimosas, torcidos ou limonados, entre outros (vários tipos de sortido, bolo-rei e pão-de-ló na sua época e, ainda, marmelada e geleia). Há ainda o raleiro, um sortido indistinto de pedaços de biscoitos que saíram partidos do forno, que se vende a um preço por quilo mais barato, mas sempre procurado pela vizinhança da Rua de Sousa Paupério.

Um dos seus fundadores, António Melo de Sousa Paupério, deu o nome a esta marca que já conta com mais de 1.000 clientes em todo o país. Uma marca tradicional que foi passando de geração em geração, encontrando-se atualmente na 6ª geração. Nestas passagens houve alguns momentos mais conturbados, não só os que se geram por uma gestão familiar, geracional, mas também política e económica. Em 1974, precisamente no ano da revolução e quando a Paupério celebrava os seus 100 anos, os sócios temeram pelo futuro da empresa e dos seus 68 funcionários da altura, sobretudo pela “incerteza” que acabou por gerar alguma estagnação até cerca da década de 1990, pouco depois de Portugal ter entrado para a atual União Europeia.

O início deste século foi, entretanto, marcado por uma luta de partilhas que durou cerca de nove anos, mas que possibilitou ter apenas um sócio e uma gestão mais focalizada na modernização e crescimento da empresa. Desde então, a Paupério assistiu a algumas intervenções da sua gestão, no sentido de a tornar numa empresa operacional e financeiramente mais rentável.

De acordo com o atual responsável da empresa, Hélio Rebelo, o primeiro desafio foi o de reestruturar a parte dos recursos humanos, que impossibilitava a empresa de investir, de se modernizar, para conseguir expandir-se e responder à crescente procura. Assim, no início desta década a empresa conseguiu rescindir contrato com muitos dos seus funcionários, que já trabalhavam na empresa há mais de 40 anos e, portanto, perto da idade da reforma, arredondando o número de trabalhadores para 30. Esta redução permitiu uma elasticidade financeira para fazer face à crise que então se implementara.

Foi precisamente nesta altura que a Paupério entrou no mercado “gourmet” ou “mercearia fina” como a caracterizam. Com biscoitos regionais, de liga mais leve e não tão amanteigados, foram introduzindo o seu sortido tão famoso em lojas gourmet e em lojas de artigos variados, maioritariamente com artigos de marca portuguesa. Para além deste segmento, conseguiram incrementar a sua produção para o segmento escolar, hospitalar, vending, e também o do retalho, chegando a produzir para a marca própria de um dos maiores players de retalho nacional. Adicionalmente, abriram uma loja no Porto, no Mercado Bom Sucesso, ficando assim com 3 lojas próprias: Valongo, Rio Tinto e Porto.

Outra das medidas que adotaram teve que ver com os turnos laborais, dado que a sazonalidade também se faz sentir neste mercado. Há uma redução da procura nos meses de verão, tendo passado a produção a operar apenas 40 horas, de 2ª a 5ª feira, das 8h às 13h e das 14h às 19h, tendo um impacto favorável nos custos de energia, dado que os fornos deixam de trabalhar um dia na semana. A partir de Outubro, quando a produção já começa a ser planeada atendendo aos cabazes de Natal que, por sua vez, têm um elevado peso nas vendas, então os 5 dias da semana são novamente preenchidos.

Neste momento a capacidade produtiva utilizada é de 100%, distribuída, na sua quase totalidade, para o mercado nacional. A exportação é, sobretudo, para países onde se encontram comunidades portuguesas, saudosistas deste sortido secular: EUA, Alemanha, França, Reino Unido, Suíça, chegando também a ter um cliente no Japão, que no primeiro contacto logo se “enamorou” pelos biscoitos únicos. Chegam também a vender para Angola via cash & carry, ou através de encomendas específicas de cabazes de Natal para empresas portuguesas que lá se encontram implementadas.

Apesar do seu crescimento ter sido, nos últimos anos, sempre a rondar os 10%, a Paupério sente a necessidade de inovar, de aumentar a sua capacidade de produção, não só para o mercado nacional, cuja procura continua crescente, mas também aumentar e expandir o seu leque de exportações. Para tal, foram feitos recentemente dois investimentos relevantes, e que, simultaneamente, permitirão a certificação da empresa: por um lado, a aquisição de uma nova máquina para fabrico de biscoitos, que aumentará a capacidade produtiva de forma significativa (cerca de três vezes mais), libertando mão-de-obra para o embalamento, ficando o processo concluído mais rapidamente e em maior quantidade, aumentando a margem por produto. Por outro lado, a aquisição de um software desenhado para a indústria alimentar, que possibilita analisar os custos em todas as fases do processo de produção e, assim, otimizar o custeio dos produtos e analisar produtos menos ou não rentáveis.

Novas metas serão traçadas para a Paupério já a partir de 2016: com todos os “ingredientes” disponíveis, esta empresa poderá alcançar novos mercados, reforçar a sua presença no mercado nacional, reformular o leque de produtos, e crescer acima do atual milhão de euros de faturação. Ambição não falta à atual gestão desta PME que, no seio da indústria alimentar, poderá levar o biscoito tradicional português ainda mais longe.

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