Design e artesanato, um encontro no Algarve

O projeto Tasa pretende trazer a inovação estratégica à atividade artesanal afirmando-a como uma profissão de futuro.

Mónica Monteiro
15 de Agosto de 2018

Como surgiu a ideia do projeto Tasa? 

O Projecto TASA surgiu em 2010 pela iniciativa da CCDR Algarve com a intenção de introduzir inovação estratégica na atividade artesanal do Algarve, afirmando-a como uma profissão de futuro.  A CCDR contratou uma equipa de designers que executou as ações previstas na primeira fase, nomeadamente a criação de 27 produtos em colaboração com 11 artesãos. Passado esse ano de projeto, o desafio foi o de dar continuidade ao projeto sem depender do financiamento público. Em 2012 foi celebrado um protocolo da CCDR Algarve com a Proactivetur – empresa de Turismo Responsável – para a gestão do projeto, sem custos para a entidade promotora, situação que vigora até à data.

Quais são os valores na base de todo o projeto? 

A missão do Projecto TASA é a de afirmar a atividade artesanal, nomeadamente as artes tradicionais algarvias, como uma profissão de futuro. É necessário, então, que estes saberes ancestrais ligados um contexto cultural e económico específico (marcadamente rural) da região, continuem a ser consideradas úteis, pertinentes e apetecíveis nos tempos de hoje. Estamos a falar, por exemplo de dar novos usos à técnica da empreita (entrelaçados com a folha da palma), da cestaria em cana, da olaria, da latoaria, da tecelagem em linho ou da cortiça com uma abordagem mais contemporânea que responda às necessidades atuais. Com isto, irá estimular-se a procura e, a par, aliciar-se novas gerações de artesãos que garantam a continuidade de um importante e distintivo património imaterial.

Mas acreditamos que só é possível dar continuidade às artes tradicionais se se trabalhar numa lógica de sustentabilidade em que interajam os valores da ecologia, da ética, da viabilidade económica e da diversidade cultural. Ou seja, utilizar materiais naturais, tratados de forma sustentável e desenhados para durar. Atribuir o valor justo ao trabalho artesanal tendo em conta o tempo que requer, no sentido de contribuir para uma sociedade justa e equilibrada, favorecendo também a criação de economia nos territórios de baixa densidade populacional. Promover a consciencialização para o consumo responsável, preocupado com as alterações climáticas e interventivo na construção de um futuro viável para as gerações vindouras. E, por fim, contribuir para a preservação da cultura mantendo ativos os saberes ancestrais ligados aos ofícios manuais. Estes são os valores com que nos pautamos e que nos levam a crer na possibilidade de futuro para ofícios que atualmente estão ameaçados de extinção.

Qual é o fator critico de sucesso do mesmo? 

Os artesãos. A existência de detentores de saberes dos ofícios artesanais em sintonia com esta visão e dispostos a colaborar com a missão do Projecto TASA. Sem esta condição de base não é possível avançar muito.


Qual tem sido a reação e a gestão de todos os stakholders do projeto? 

Com muita satisfação nossa verificamos que estamos gradualmente a juntar um conjunto consistente e promissor de parcerias. Os artesãos com quem continuamos a colaborar, ou que temos vindo a juntar à rede, são verdadeiros embaixadores do TASA. Há um respeito mútuo e um diálogo muito próximo que cria um espaço fundamental de confiança. Os artesãos não são meros fornecedores, são um agente fundamental de alteração do velho paradigma da desvalorização das artes manuais ligadas à ruralidade. Os nossos parceiros comerciais representam marcas, instituições, projetos, empresas que conhecem a missão do TASA, os seus valores, e fazem questão de pertencer a um movimento pelo resgate das artes tradicionais que, além de mais, permite valorizar e diferenciar os seus espaços e a experiências dos seus clientes.

O cliente do TASA constata, em grande medida, a tendência crescente de um tipo de consumo mais responsável, interessado no produto que compra, em perceber de que é feito, como é feito, que história conta e que valores representa. São pessoas que valorizam muito a cultura, o design sustentável, as matérias-primas naturais, o lado humano e diferenciador da peça. Temos imenso prazer em contactar com os nossos clientes.

Colaboramos também com instituições públicas, sobretudo municípios, no sentido de intervir para a valorização das artes e ofícios dos seus territórios (caso de Alcoutim, Silves e Loulé). Outras instituições, como a CCDR Algarve, a Direção Regional de Cultura, o IEFP, a Universidade do Algarve, têm-se disponibilizado para participar em debates inerentes à preparação de propostas de ação. Sentimos que, à nossa medida, temos dado um contributo para a tomada de consciência de entidades (e também do público em geral) para a realidade das artes e ofícios de cariz tradicional da região.


Qual tem sido a reação do mercado ao projeto? 

Tem sido cada vez melhor. Estamos numa altura ideal em que o mercado desperta para a produção artesanal de alto valor cultural, diferenciadora e inserida numa lógica de economia circular. Há uma consciência maior sobre o impacto que as nossas escolhas como consumidores têm para o desaceleramento das alterações climáticas e também para a diminuição das desigualdades sociais.  Com consumidores mais conscientes e exigentes abre-se espaço para formas alternativas de produção, concretamente, para a produção artesanal. Temos verificado uma maior procura de produtos do nosso catálogo, e também por parte de gabinetes de interiores e arquitetura para desenvolvimento de produtos personalizado destinados a espaços de hotelaria, escritórios e restauração. Além dos produtos, também tem vindo a aumentar a procura de workshops e experiências criativas relacionadas com as artes tradicionais.

Quais as principais dificuldades sentidas até à data? 

Por causa do aumento na procura, tem-se verificado uma maior dificuldade na resposta. Ou seja, acentua-se o aspeto crítico de que falávamos antes, que é o número reduzido e a idade avançada dos artesãos. A média de idades dos artesãos que colaboram com o TASA nalguns dos ofícios ascende os 70 anos. Daí que a Proactivetur, na qualidade de gestora da marca Projecto TASA, tenha decidido investir num programa de capacitação de novos artesãos (Programa “Artesãos do Século XXI), sem ficar à espera da iniciativa de entidades públicas.

Outra dificuldade prende-se com a cultura de desvalorização instalada na sociedade. A grande maioria dos artesãos das artes tradicionais algarvias é reformada, exerce esta atividade de forma complementar, e vê nela, acima de tudo, uma legítima função social, de ocupação dos tempos livres e realização pessoal. Comercializam os produtos nos mercados locais, sem fazer depender disso a sua economia. O facto de não refletirem no preço o devido valor da sua produção, inibe o processo de consciencialização do consumidor e atração de novos artesãos.

Qual o balanço do trabalho desenvolvido até ao momento? 

Nestes seis anos de gestão do TASA passámos por muitas fases e aprendemos muito (aliás, ainda estamos a aprender). Atuamos numa área complexa e em mudança. Vamos contra a corrente de uma mentalidade de desvalorização destes saberes que são associados à pobreza e à falta de “cultura” do povo. Mas também somos contemporâneos de uma época onde se estão a mudar paradigmas de consumo, sociais e ambientais, muito favoráveis a práticas de sustentabilidade e a marcas como o TASA. Temos conseguido passar por tudo isto e manter um projeto na sua fase pós-financiamento o que nos indica, por si só, que o balanço é positivo.

Ideias para o futuro? 

É continuar a rumar (a favor da corrente!) no sentido de perseguir a nossa missão e alcançar os objetivos que permitam garantir o bom curso na direção da sustentabilidade das artes tradicionais. E estar na base da construção e implementação de mais programas de capacitação e apoio à instalação de novos artesãos.

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