E isso tem sido bem visível. Mais
recentemente, temo-nos familiarizado com o termo de “transformação digital” ou
“transição digital”. Na prática, a transição tem sido feita, em cada área de
negócio, ao seu ritmo, e em cada empresa, à sua velocidade. Assim, a “transformação
digital” não representa tanto uma novidade, mas sobretudo a confirmação de uma
crescente consciencialização sobre o papel que os sistemas e tecnologias de
informação podem desempenhar em diferentes áreas de negócio.
A digitalização é um processo de
tornar os negócios diferentes, acrescentando-lhes valor, por meio de novas tecnologias.
O sucesso da digitalização depende da inovação pela tecnologia. No entanto, a
tecnologia é somente o condutor ou o facilitador da mudança. A tecnologia
proporciona novas oportunidades que podem ou não resultar com sucesso, perante
outros fatores que genericamente se podem agrupar em duas dimensões críticas:
negócio e cultura.
Neste período crítico que
atravessamos, e em que nos vimos confrontados com a necessidade de implementar
respostas ágeis, em poucos dias, a desafios súbitos, encontrámos na tecnologia o
veículo para essa resposta pronta que, por sua vez, impediu um abalo ainda mais
imediato e significativo na nossa economia.
O serviço nacional de saúde e a rede de hospitais recorrem diariamente à partilha das suas bases de dados digitais e a ferramentas de análise de dados para poderem fazerem previsões, as que diariamente pretendemos ouvir, e poderem tomar decisões informadas que permitam planear todo o trabalho quotidiano dos serviços de saúde. O governo reforçou a presença digital dos serviços de apoio aos cidadãos. As lojas de comércio local recorreram prontamente às redes sociais para divulgarem os serviços. Muitos restaurantes aderiram a plataformas on-line que facilitem a entrega das refeições que preparam à casa dos clientes. As vendas on-line cresceram. Os sistemas de cadeia de abastecimento permitiram dar resposta à abrupta mudança da procura.
As escolas, a todos os níveis de ensino, recorreram a técnicas de ensino a
distância. Soluções similares foram também adotadas, por exemplo, por ginásios.
Muitos milhares de trabalhadores estão neste momento em teletrabalho a partir
de casa. Por outro lado, nos setores de atividade em que o teletrabalho não é
uma opção, vemos algumas empresas a alterarem as suas linhas de produção para
passarem a fabricar produtos que se tornaram neste momento cruciais, como
máscaras, batas, ventiladores, ou gel desinfetante. Também novas apps surgiram para
monitorizar movimentações durante a quarentena ou o tempo de fila de espera em farmácias
e supermercados, por exemplo. Nada disto seria possível sem as tecnologias de
informação, “cloud computing”, internet, VPN, impressoras 3D, sistemas de SCM,
sistemas de e-commerce, etc.
A crise provocada pelo novo coronavírus
veio revelar, em poucos dias, que muitos dos fatores inibidores da
transformação digital podem, afinal, rapidamente deixar de ser fatores
inibidores. Perante um desafio tangível, muitas empresas procuram alterar, de
forma ágil, os seus modelos de negócio, as suas estruturas de trabalho e, assim,
pôr em prática a sua transição digital: tornando os negócios diferentes,
acrescentando-lhes valor, e usando as tecnologias.
Contudo, nem todas as empresas
puderam responder da mesma forma. Para algumas, sobretudo para as empresas da
área do turismo e lazer, a transição não será tão fácil ou imediata por causa
da natureza do seu negócio, para outras, por falta de infraestrutura tecnológica
e serviços necessários para a resposta. Mas ficou evidente que as tecnologias
de informação vieram mudar o paradigma. Assim, prevejo que os fatores “culturais”,
que são tradicionalmente considerados inibidores da digitalização das
organizações, possam de futuro ser muito mais facilmente ultrapassados perante casos
concretos de sucesso e uma nova perceção daquilo que as tecnologias de informação
podem oferecer em várias áreas de negócio. Os gestores estarão muito mais
conscientes da necessidade de repensar os seus processos de negócio e inovarem
de forma a darem respostas eficazes à crise que se aproxima.
A atual ameaça à saúde pública e
as medidas de quarentena tomadas para a sua mitigação vieram mostrar às organizações,
de forma ainda mais clara, a necessidade e as vantagens de acautelarem a sua
transição digital. O vírus veio mostrar às organizações que deverão reforçar o
seu parque tecnológico no caminho justificado da sua transformação digital. Mas
esta não se faz sozinha: precisa da ação concreta das pessoas e de líderes que
a promovam.
Estes últimos dias têm mostrado que uma economia mais digital é uma economia mais bem preparada para lidar com a “doença”, mas também mais capaz de resistir aos efeitos secundários recessivos da “cura”.