Estava perdido no meio de uma praça em que o sol sorridente no
país do sol nascente não se fazia notar devido ao aglomerado torres com
inúmeras portas, pontes elevadas, elevadores e milhares e milhares de japoneses
a correrem de um lado para o outro, a entrarem e saírem do metro, estilo
cardumes ou aves em bando extremamente organizados e despachados, mas ao mesmo
tempo um silêncio atroz. Nem um salto alto de uma executiva a bater no chão,
nem sequer o carro se atreve a tocar no instrumento mais usado em Portugal que
é a buzina.
No meio daquele turbilhão todo, uma pilha de papeis que
estava na minha mão caiu ao chão espalhando-se por todo o lado. Todos os que se
movimentavam num raio de 5 metros (e eram muitos) a mais de 8 km/h de passada,
pararam. Os de gravata, as dos saltos altos, os de pasta na mão, os turistas
locais. Todos apanharam os papeis que eu trazia, entregaram-me em mão,
saudaram-me com uma vénia à qual repliquei e lá continuaram a sua passada estilo
marcha. Os papeis não me foram entregues pela ordem que eu trazia, mas julgo
que se solicitasse, o tinham feito…
Continuei perdido, um senhor ofereceu-me ajuda pois ia para
um dos pisos daquela torre e às 12:55h lá estava na receção à espera de entrar.
Sabia que em 5 minutos seria chamado, até porque um mês antes quando tinha ido
a Tokyo pela primeira vez em trabalho, tinha assistido a uma reunião com a presença
de um alto dirigente do governo português, a chegar atrasado 20 minutos a uma
reunião que ia durar uma hora, e a reunião terminou passados 40 minutos.
Às 13:00h lá estava eu sozinho junto a 5 executivos de topo
dos diversos departamentos da organização, numa reunião que duraria uma hora
exata e prometeram dar-me uma resposta em 24 horas. Assim o fizeram. A resposta
era um “NÃO” e assim ficou fechado aquele negócio.
Pontualidade. Solidariedade. Respeito. 3 valores que não
abundam no nosso país.
Pontualidade. Quantas vezes se marca uma reunião e tem que
se ficar à espera (eu pessoalmente não espero mais do que achar razoável e
muito menos se não tiver alguma explicação para o atraso). Escrevo no Porto, se
passar na A28 perto da hora de almoço e vir um avião da Lufthansa já no ar,
tenho a certeza de que são 12:30h. O LH1177 partiu às 12:25h como sempre. Reúne-se
muito e a maioria das vezes para se sair da reunião com uma mão vazia e outra cheia
de nada em soluções. Há uns tempos, quando sabia que as reuniões eram para
“enrolar” arranjei uma mesa alta, tipo balcão de bar e reunia com essas pessoas
de pé. Eram tão rápidas essas reuniões… A pontualidade a meu ver está
claramente indexada aos países de primeiro mundo e onde a taxa de
desenvolvimento, seja económico ou social tem claramente mais sucesso.
Solidariedade. Quantos de nós damos por vezes a ajudar
alguém na rua? Uma pessoa perdida, uma pessoa doente, parar para apanhar uma
garrafa de plástico e colocar no lixo. Elogiar em público, reprimir ou criticar
em privado. Dizer por vezes a palavra amiga que alguém tem que ouvir em
determinada circunstância da sua vida. Colocarmo-nos com frequência do outro
lado. Ouvirmos os dois lados das barricadas. Um tão número de situações que nos
levaria ao meu princípio basilar para tudo isto. Justiça. Quem tiver uma boa
justiça mental, tem uma boa solidariedade social, e daí advém todos os outros
atributos. Aquelas largas de dezenas de pessoas tinham muito para fazer, mas
pararam. Nós também temos sempre muito para fazer, mas por vezes não separamos
o urgente do importante, e por vezes nem reparamos que um tempo para nós também
é muito importante antes de se tornar urgente. Até connosco temos que ser
solidários.
Respeito. Respeito é “PALAVRA!” O respeito exige verdade,
exige coragem, exige em olhar olhos nos olhos para dizer um sim ou um não. Parece
por vezes que são os investidores que têm mais medo de dizer sim ou não, do que
o empreendedor tem em ouvir a sua decisão.
Recordo o “NÃO” acima descrito no Japão. Ficou ali fechado aquele acordo, mas
as portas abertas.
Em Portugal tem pouco significado qualquer atitude semelhante a esta. Há poucos
com coragem para não irem sempre além de um “NIM”. Há poucos que respondem a
chamadas, mensagens ou emails quando não sabem / podem / querem dizer “NÃO”.
Talvez porque julgam que já o disseram com o seu silêncio, mas esse silêncio só
alimenta as expectativas, que frusta qualquer empreendedor durante meses e põe
em risco todos os planos traçados, pois há pessoas que para elas o tempo é efémero,
mas há máquinas estatais que não olham para timings.
Pior ainda quando não estás a falar com incautos
endinheirados ou bem relacionados, estou-me a referir quando quem está a este
nível são estimados cidadãos respeitáveis, em que a sua douta palavra seria
intocável e a sua determinação admirável.
Desiludam-se, pois a seguinte sondagem tem por base uma amostragem de cerca de
1500 pessoas, todas contactadas pessoalmente. Em Portugal, 1 em 10 dizem sim ou
não. 1 em 70 cumprem o que afirmam. 1 em 90 são altruístas. 1 em 500 têm
palavra, são generosos e altruístas (sim, conheci 3). O resto, são feitios e
forma de ser que temos que aceitar como são, e isso é que faz a diversidade da
população portuguesa.
Como diria Fernando Pessoa: “Não haja medo que a sociedade se
desmorone sob um excesso, de altruísmo. Não há perigo desse excesso.”