16 de Agosto de 2022


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SUSANA BARROS

Especialista em Liderança e Estratégia



Liderança vs. Gestão: as 2 faces da moeda



Liderar ou gerir? A resposta ideal é: ambas.



L

iderança e Gestão são sistemas de ação distin­tos e complemen­tares entre si.

Ambas são necessá­rias para que as em­pre­sas sejam bem suce­di­­das num mundo cada vez mais complexo e volátil.

E podemos usar exatamente estas duas palavras para as definir.

A Gestão lida com a Complexidade e a Liderança lida com a Volatilidade, com a Mudança.

A Gestão é um conjunto de processos que mantém um sistema complexo de pessoas e de tecnologias a funcionar de forma afinada. Inclui atividades como o planeamento, a orça­­men­tação, a organização de recursos e a identificação e resolução de problemas e permite aumentar a probabilidade de os resultados de curto prazo serem entregues. Sem uma boa gestão, as empresas rapidamente podem tornar-se caóticas.

A Liderança, em contrapartida, lida com a mudança. Define uma visão de futuro e a estratégia para lá chegar, alinha as pessoas em torno dessa visão e dessa estratégia e inspira-as a colaborarem para fazerem com que se concretize apesar dos obstáculos.

O problema é que a maioria das empresas tem excesso de gestão e défice de liderança.

Isto não acontece por acaso.

Ao longo do século XX, e em particular na 2ª metade do século, o mundo assistiu ao nascimento de milhões de empresas, fruto da revolução industrial e da massificação da produção. À medida que as empresas cresciam, eram necessários gestores para controlar um cada vez maior número de trabalhadores.

Por cada líder visionário, eram necessários dezenas ou centenas de gestores, capazes de garantir que a “máquina empresarial” funcionava corretamente e estava bem oleada.

Desenvolveram-se, então, inúmeros programas de gestão e muito poucos de liderança. Em parte, porque havia muito maior procura do lado da gestão (das competências técnicas, como o marketing, as finanças, a logística, etc., também chamadas de “hard skills”), mas também porque ensinar liderança é naturalmente mais difícil, dado que envolve competências comporta­mentais, as chamadas “soft skills” (que fique registado que não concordo com este nome, dado que, na minha opinião, não têm nada de “soft”).

Este desequilíbrio entre gestão e liderança justificou-se ao longo do século XX, em que o ritmo de mudança era relativamente lento, o contexto relativamente estável, o tempo de vida médio das empresas era muito longo (media-se em décadas) e as pessoas 

tinham o chamado “emprego para a vida”, tendo apenas que desempenhar cada vez melhor as funções para as quais haviam sido treinadas.

A realidade do século XXI é totalmente diferente. O ritmo de mudança é cada vez mais rápido, o contexto em que as empresas operam é cada vez mais volátil e incerto, o tempo de vida médio mede-se em anos e não em décadas e a crescente automação veio obrigar a um constante reskilling e upskilling da força de trabalho. Já não existem “empregos para a vida”, até porque a maioria das empresas não sobrevive uma vida.
Neste contexto volátil e incerto, cada vez mais competitivo, as empresas precisam de ser mais rápidas a mudarem e a adaptarem-se constantemente para garantirem a sua sobrevivência. E maior mudança exige sempre maior liderança.
Diz-se que estamos a atravessar uma crise de liderança.
A verdade é que temos muitos gestores e poucos líderes, fruto da falta de investimento das empresas e das universidades na sua formação. Sim, ao contrário do que muitos pensam, a liderança não é um dom inato, que se tem ou não se tem. É uma competência, que pode e deve ser treinada e desenvolvida, como um músculo.
A questão principal é que a liderança não é para todos. Porquê?

Primeiro, porque não podemos escolher ser líderes. A liderança pressupõe seguidores, sendo que seguir é um ato voluntário. Se pre­cisamos de hierarquia e poder para exercer influência sobre os outros, se não conseguimos inspirá-los a seguir-nos, somos simplesmente chefias. Mandamos, não lideramos.

Segundo, porque exige um enorme sacrifício pessoal. A liderança é um exer­cício de responsabilidade, de exem­plo, de rumo, de motivar as pessoas a acreditarem e a trabalharem para concretizar a visão definida e partilhada por todos. Liderar é servir.

Por último, porque não acontece da noite para o dia. Não é possível fazer um curso de liderança e sair de lá um líder. Ela é como um músculo, exige treino, disciplina e consistência, e é sempre um “work in progress” ao longo da vida.

Um dos erros mais frequentemente cometidos pelas empresas é basearem-se na performance como critério de promoção a lugares de liderança. Nada podia estar mais errado.

O facto de uma pessoa ser muito boa a desempenhar uma determinada função não a qualifica para liderar uma equipa. O trabalho desta pessoa deixará de ser executar a função e passará a ser o de liderar as pessoas que executam a função, garantindo-lhes as melhores condições possíveis para o fazer. As competências necessárias são total­mente diferentes!

A liderança exige empatia, confiabilidade, escuta ativa, comu­ni­cação, gestão de conflitos, colaboração, alinhamento, direção, exemplo. Estes deveriam ser critérios igualmente importantes para selecionar líderes, não apenas a performance.

O que acontece em muitos casos, é que se perde um excelente profissional e ganha-se um péssimo líder. E um péssimo líder pode causar muitos estragos, no longo prazo.

Há muito trabalho a fazer nas empresas para desenvolver mais e melhores líderes.
Neste contexto volátil e incerto, cada vez mais competitivo, as empresas precisam de ser mais rápidas a mudarem e a adaptarem-se constan­te­mente para garantirem a sua sobre­vivência. E maior mudança exige sempre maior liderança.É trabalho urgente agora – tal como no século XX foi urgente formar gestores - já que sem boa liderança nos vários níveis das organizações será extremamente difícil a adaptação cons­tante à mudança, capacidade essencial não apenas para sobreviver, mas para prosperar.



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