As Vendas
Ao contrário do que se passou em vários momentos, em que alguns mais distraídos terão vaticinado o fim da função de Vendas, desta vez houve mais cautela nas previsões e os velhos do restelo não quiseram voltar a falhar. Publiquei um artigo no início de 2019, no qual escrevi que não via qualquer inconveniente em entrar num chat e ver a minha questão atendida por um assistente virtual até porque a inteligência artificial permite hoje chegar a um refinamento, impensável há muito pouco tempo. Escrevi também algo que hoje reitero com igual convicção: Na verdade, o papel do vendedor não perdeu importância. Alterou-se!
Nessa altura, faltavam mais de 3 anos para chegarmos ao dia 30.11.2022, data em que o Chat GPT viu a luz do dia e nos deixou algo surpreendidos, ao ponto de se ter tornado na inovação do mundo tecnológico a atingir mais rapidamente 1 milhão de utilizadores. Em fevereiro de 2023, estava a assistir a uma conferência numa reputada universidade e o palestrante, de reconhecida competência, depois de aprofundar o tema chegou à parte das perguntas e respostas, e foi ao longo desta fase da palestra que fui consolidando uma perceção que, por agora, se tem mantido inalterada:
- A IA pode ferir de morte algumas atividades, pode levar a que não sejam necessárias tantas pessoas alocadas a determinadas profissões, pode ser um catalisador para muitas funções e empresas, e será também uma importante fonte de emprego.
Se do ponto de vista do utilizador podemos desde já falar em democratização da IA, interessa perceber se isto se aplica também às empresas, e aqui as dúvidas talvez sejam maiores. Numa camada muito profunda temos gigantes como a Microsoft, a Google ou a Apple, que além dos investimentos diretos em R&D, têm capacidade de adquirir startups, financiar projetos, fazer parcerias e de entrar no capital de várias empresas promissoras. Temos depois um vasto conjunto de empresas que, partindo do muito que
já foi desenvolvido, trazem para as suas áreas de atuação saltos qualitativos muito significativos e, diria eu, talvez seja aqui que se enquadram as Vendas.
Que as Vendas não são uma área isolada dentro das empresas, já sabemos há tempo suficiente, contudo todas as oportunidades são boas para uma aproximação ao Marketing, ao Serviço a Clientes, às Tecnologias e a uma visão mais holística sempre centrada no Cliente. Estando em causa vendas B2B de caráter mais complexo onde não existe propriamente uma compra por impulso, a IA pode ser aplicada de variadíssimas formas, destacando-se desde já as seguintes:
- Padrões de Consumo - A deteção de comportamentos ajuda as empresas a antecipar necessidades e a alocar recursos mais eficientemente.
- Tratamento de Dados - Com informação em larga escala o desafio passa por obter atempadamente dados de suporte à estratégia comercial, como seja, por exemplo, uma boa segmentação.
- Customização - Uma abordagem personalizada com criação de conteúdos específicos potencia uma comunicação mais eficaz e propicia um aumento das taxas de conversão de leads.
- Tempo - A automatização de tarefas pelas quais nenhum Cliente pagaria liberta a Força de Vendas para atividades de maior valor acrescentado.
- Serviço a Cliente - E porque a jornada não termina com um acordo, o suporte aos Clientes disponível 24 horas por dia pode melhorar de forma exponencial a sua experiência.
Os Números
Um estudo da Gartner envolvendo 1.100 vendedores B2B, permitiu concluir que a adoção de aplicações suportadas em IA, vai provocar alterações radicais na alocação de tempo destes profissionais de vendas:
• Prospeção - De 15% para 5%
• Planeamento e Preparação de reuniões com Clientes - De 30% para 17%
• Chamadas telefónicas de Vendas - De 18% para 22%
• Negociação e Fecho de negócios – De 13% para 16%
• Contornar e encontrar soluções alternativas - De 9% para 6%
• Atividades de não vendas - De 15% para 7%
Uma conclusão simples é que o tempo alocado a Clientes cresce, o desperdício tem uma quebra brutal e, por fim, sobra 27% do tempo! Ainda que esteja em causa um estudo que tem, como qualquer outro, a sua a margem de erro, imagine-se a vantagem competitiva que poderá ter uma Força de Vendas que libertou 27% do seu tempo.
Por outro lado, a International Data Corporation (IDC) prevê que o investimento em IA em Portugal no corrente ano de 2024 irá ultrapassar os 100 milhões de euros (aumento superior a 20% face 2023) e que a IA poderá assumir mais de 40% das tarefas normalmente associadas ao Marketing (otimização de conteúdo, segmentação, análise e tratamento de dados dos Clientes e qualificação de leads).
Finalmente, a McKinsey prevê que a IA generativa (a que se foca na criação de novos conteúdos como texto, imagem ou áudio – Exemplo: conteúdo para um site) pode gerar entre 2,6 biliões de dólares e 4,4 biliões de dólares por ano a nível mundial e que a IA não generativa (a que se foca em tarefas de compreensão e processamento de dados – Exemplo: Classificação de mails como Spam) pode atingir 17 biliões de dólares.
A regulação
Adam Smith surge agora no âmbito desta reflexão por ter criado o conceito de “mão invisível” que, resumidamente, traduzia a ideia de que um mercado livre e competitivo potenciaria uma eficiente alocação de recursos. Ora esta realidade secundarizaria a importância do Estado, que deveria ter um papel muito limitado na regulação da economia. O que se passa é que sem uma regulação cuidada o mercado pode enveredar por alguns caminhos… menos recomendáveis.
Estou convicto que, no que à IA diz respeito, haverá muito trabalho no imediato, não obstante as toneladas de informação que têm sido produzidas.
Está disponível no site do