24 de Agosto de 2025


RUI GUEDES

Di­retor de Vendas das Pá­ginas Ama­relas




Da Atenção à Advocacia



Um título tão claro como o deste artigo remete de imediato o leitor para o “Marketing 4.0” de Kotler e pode então perguntar-se se fará sentido trazer esta obra agora, quando sabemos que o autor já teve energia e engenho para publicar várias depois desta. 




A

resposta é que no referido livro há perspetivas de uma grande pertinência, que nos abrem caminhos para abordagens multidisciplinares que ampliam a visibilidade que podemos ter sobre os Clientes, e portanto… Sim, entendemos que faz todo o sentido.

Os Cinco Ás

O AIDA – Atenção, Interesse, Desejo e Ação - um dos modelos mais usados para ilustrar o comportamento do consumidor ao longo do processo de compra, vai fazendo o seu caminho, tem muita utilidade decorrente até da sua simplicidade, mas tem certamente algumas fragilidades que vários autores se apressaram a identificar. Depois de várias abordagens, mais ou menos conseguidas, surgiu o Modelo dos Cincos Ás que nos alertou em primeira Instância para o facto da influência social ser determinante nas decisões que tomamos, já que vivemos num mundo altamente conectado.

 

 


Modelo dos Cincos Ás que nos alertou em primeira Instância para o facto da influência social ser determinante nas decisões que tomamos

Vejamos então qual pode ser o percurso do consumidor tocando sucintamente em cada uma das 5 fases.

Atenção - Os consumidores são expostos a uma multiplicidade de marcas que não estão obrigatoriamente indexadas a estratégias de marketing altamente estruturadas. Efetivamente, todos sabemos que, por exemplo, a leitura acidental do testemunho de um Cliente, pode espoletar o acender desta luz.

Atração – Depois de um processamento inicial de várias mensagens, os consumidores são atraídos somente para uma curta lista de marcas num processo de filtragem muitas vezes feito até de forma, senão completamente inconsciente, pelo menos, altamente subjetiva.

Aconselhamento – É neste estágio de pesquisa ativa por mais informação, feita diretamente junto das marcas, junto da família ou amigos, através das avaliações de Clientes ou até de testes a um produto, que o caminho do consumidor muda de individual para social.

Ação – Esta, considerada ainda por muitos como a derradeira fase, consiste, como o próprio nome indica, na passagem à ação por parte do consumidor e não se trata obrigatoriamente de uma compra.

Advocacia – Quando as pessoas criam um forte envolvimento com a marca podem ser impelidas a defenderem-na, a contarem boas histórias acerca dos seus méritos, tornando-se como que advogados que defendem a sua causa até ao limite das suas forças.

A Influência

Apesar do Modelo dos Cinco Ás nos ser apresentado de uma forma devidamente organizada, deve ter-se em conta que nos dias de hoje o percurso do consumidor não é necessariamente um funil, não segue um único padrão e, portanto, esta sequência nem sempre é religiosamente seguida. Ainda que os consumidores possam saltar entre estágios ou até deixar cair alguma fase, interessa vincar que estamos perante

uma ferramenta flexível que, além de poder ser aplicada aos mais variados setores de atividade, nos oferece a possibilidade de identificarmos com mais clareza um percurso que pode ser comparado e utilizado estrategicamente.

É um lugar comum referir-se que as empresas existem porque há Clientes, mas convém ter isto mesmo muito presente para não nos desviarmos do caminho e continuarmos do lado certo da história. Se a derradeira meta é maravilhar os Clientes ao ponto destes se converterem em advogados fiéis, então pode ser útil relembrar que vivemos dias nos quais estamos expostos a um excesso de “tudo”, pelo que, navegando entre mais mobilidade e conectividade, com escassez de tempo para tudo o que se quer fazer e com níveis de concentração a reduzirem-se, as empresas têm mesmo que fazer escolhas. Sem saber como será o dia de amanhã, hoje é muito claro que não é pelo facto de uma marca se por aos berros e lembrar-se de maximizar os pontos de contacto com os Clientes, que ela vai aumentar a sua influência e ser mais eficaz na comunicação.

Perceber o percurso do consumidor, identificar os seus pontos de contacto com a marca e selecionar onde se pode intervir para entregar um valor diferenciado podem ser algumas boas práticas, que excluem aquela ideia fantasiosa de um contacto omnipresente que, a ser real, seria até porventura intrusivo e algo sufocante. As decisões que um consumidor vai tomando através dos 5 Ás são impactadas por uma combinação de três fontes principais de influência que as empresas podem usar com mais ou menos eficácia.

Influência Externa - Tem origem em fontes exteriores ao Consumidor e cabem aqui iniciativas de marketing, Equipas de Vendas, Customer Success, etc. Tudo isto está do lado da empresa/marca e portanto esta capacidade de influenciar pode ser gerida a começar desde logo pela mensagem, pelos meios e pela frequência.

Influência de Outros – Neste nível, em que o consumidor poderá estar em diálogo com amigos e familiares, não é fácil para as empresas gerir e controlar o resultado desta influência. Contudo, estamos longe de atirar a toalha ao chão, pois a influência dos outros vem também das conversas nas redes socais e pode ser por isso importante saber se temos por lá influenciadores ou advogados fieis, a dar testemunhos reais daquilo que somos capazes de entregar.

Influência Própria – Assumindo que esta é a influência que emana do próprio consumidor, poderíamos ser levados a pensar que este é mesmo um terreno interdito às empresas. O que se passa é que nenhum homem é uma ilha e aquilo que entendemos ser a nossa própria vontade, resulta também das nossas experiências, das interações que tivemos com as marcas, do boca a boca (dos outros) e da publicidade (externa).

As três grandes fontes de influência estão portanto sempre interligadas.

As Pessoas

As empresas são sobretudo pessoas e estas, ainda que possam ter a sua autonomia e o seu espaço de atuação, são também condicionadas pela estratégia definida, por normas, por práticas enraizadas, por prioridades, pela conjuntura, por critérios de racionalidade económica e por uma cultura organizacional que pode ser mais ou menos mobilizadora.

Nas Vendas os objetivos são quase sempre muito desafiantes, há comissões que têm que ser ganhas, os objetivos são para atingir, cada um tem que contribuir com a sua parte para o bolo final e portanto, há que arregaçar as mangas e ir à procura de construir os resultados dia após dia. Os profissionais de vendas estão habituados a isto, não se deixam abater com facilidade e sabem que cada “não” que ouvem, só os aproxima do próximo “sim”. Contudo, quando ouço falar do dilema das vendas, é porque chegou o momento de reiterar que temos que ser muito claros na nossa atuação e separar completamente as águas. Um vende­dor, suportado numa necessidade que

encontra ou até desperta num Cliente, segue um processo de venda para chegar a um acordo e, certamente que esse resultado vai contribuir para a atingimento dos seus objetivos. O que deve ser muito claro é que se esse acordo não servir para satisfizer uma necessidade do Cliente, não deve ser feito!

Um vendedor é um maratonista e não um corredor de 100 metros! Assim, para além de dever reger-se por um conjunto de Valores fazendo aquilo que está certo, deve ter sempre muito claro que lhe cabe cimentar relações de longo prazo suportadas na confiança que um Cliente lhe passou e não pode ser desbaratada. Se não há uma venda naquele momento (com todas as pressões do objetivo, das comissões, da liderança, da concorrência desleal, etc.) fica o contacto de alguém que se vai lembrar do seu comportamento numa oportunidade futura e… muitas outras oportunidades estão mesmo ali ao lado.

Ao longo dos anos que não me canso de referir que o Vendedor voluntarioso que acha que tudo faz e tudo pode sozinho, morreu! Muitas vezes poderá até ser o rosto da empresa perante o Cliente, mas tem ao seu lado Marketing, Customer Success entre outras áreas, que em conjunto suportam uma abordagem bem mais estruturada e robusta. Dizer, por exemplo, que o Vendedor está lá para vender e que CS está lá para reter é altamente redutor e mesmo errado, já que se exige um trabalho em Equipa que ao mesmo tempo que gera resultados, zela pela reputação da empresa entregando o prometido e garantindo muito para lá da venda, níveis de excelência na experiência do Cliente.

Conclusão

As empresas são confrontadas com desafios crescentes e com muitas origens que as obrigam a estar em constante reajuste para não perder o rumo e seguir a estratégia definida.

A digitalização deixou de ser uma opção para ser uma obrigatoriedade, a incorporação de IA avança vertiginosamente apesar de tudo ainda estar no início, as interações com os Clientes são progressivamente suportadas em automação, é necessário estar alerta perante as ameaças e as oportunidades, e numa conjuntura onde a incerteza e a complexidade se vão rindo dos planos altamente estruturados a 5 anos, é necessário respirar e ter a lucidez de procurar entender o que por cá andamos a fazer.

Se uma empresa não tiver Clientes, encerra a sua atividade! Esta verdade insofismável que, de tão básica, pode até ser vista como ridícula, deve mesmo ser relembrada para evitar delírios desenfreados na busca de um sucesso momentâneo, ardiloso e comprometedor. Se estamos efetivamente interessados na construção de um futuro bem-sucedido, pode fazer sentido focarmo-nos no presente e pensarmos em formas de levar os Clientes da Atenção à Advocacia. A mais do que repetida centralidade do Cliente tem subjacente uma mudança de cultura que, reconheça-se, não é de todo fácil de implementar, até porque por vezes se digladiam forças aparentemente contraditórias que em muitos casos só necessitariam de ser calibradas. Os automatismos de contacto com os Clientes são suficientemente eficientes e humanizados? A digitalização é algo estritamente interno ou cria valor para os Clientes? As empresas são atraentes para parceiros, investidores, atuais e potenciais colaboradores? Há uma 



consciência coletiva para a importância da Experiência do Cliente enquanto fator absolutamente central?

Se sempre se exigiu um comportamento transparente perante o Cliente, facilitador do processo de decisão e tendo por base a tal necessidade já referida, hoje isso está amplificado pela disseminação generalizada da informação.

O caminho rumo à Advocacia é árduo mas é exequível e faz-se em cima da definição de uma estratégia, mas também em pequenas escolhas diárias. Se nos perguntam se é possível vender com transparência, a resposta deve ser que, mais do que possível, é indispensável. Ao vendedor a que chamaram ingénuo por não ter fechado aquela venda que em nada ia contribuir para resolver as necessidades do Cliente, podemos dizer que ingénuo é aquele que acredita que essa venda valeria a pena ser feita. Na presença daquele “pequeno detalhe” chamado saúde, o futuro é feito da determinação com que diariamente encaramos os nossos objetivos, mas também é feito da coragem de dizer não, para estarmos alinhados com a nossa Visão, a nossa Missão e os nossos Valores.



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