24 de Agosto de 2025


PEDRO AMENDOEIRA

Partner na Expense Reduction Analysts


Incentivar é humano


Em 1902, numa Hanói sob domínio colonial francês, a construção de esgotos, fundamental para instalar a modernidade e controlar uma praga de cólera, trouxe um inconveniente perverso: uma outra praga, de ratazanas.




Estas encontraram nos recém-construídos esgotos um local livre de predadores e um acesso rápido às casas onde podiam aceder a comida fácil.

As autoridades fizeram um enorme esforço para controlar as ratazanas na cidade, usando os recursos humanos da cidade para as matar e, já em desespero, pagando uma recompensa a quem trouxesse a cauda de um desses roedores. Muitos nativos acederam à oferta, causando o chamado “grande massacre de ratazanas de Hanói”. No entanto os números não pareciam diminuir.

Os franceses começaram a notar um elevado número de ratazanas sem cauda. Os vietnamitas estavam a apanhar os roedores, cortar-lhes as caudas e soltá-los, para que se pudessem continuar a reproduzir, garantindo o futuro da sua nova fonte de rendimento.

Este é o primeiro caso bem documentado de incentivos perversos no controlo de pestes. Terá havido um outro umas décadas antes, na Índia então colonizada pelos Ingleses. Aqui a praga eram as cobras e os ingleses pagavam pelas cabeças.




Os indianos passaram a criar cobras. Quando isso foi descoberto e a recompensa anulada, os criadores soltaram todas as cobras em cativeiro, aumentando o problema inicial.

Com os anos não parecemos ter aprendido as lições que estas histórias nos trazem. Os exemplos de incentivos perversos continuam a abundar, tanto a nível governamental como nas empresas.

Um dos mais visíveis e com maiores impactos na economia global é a atribuição de bónus de acordo com a cotação da empresa em determinado dia. Com frequência, isso faz com que os CEOs dessas empresas façam uma gestão que maximiza o curto prazo, em detrimento do longo. Bónus associados a números de vendas trimestrais fazem com que os comerciais empurrem as suas mercadorias no final do período, se estiverem perto de atingir o bónus, oferecendo incentivos aos clientes para que comprem nessa altura, prejudicando a margem, o mercado e a consistência das vendas. Estando do outro lado, compensará esperar por esses timings, para comprar em saldo.

Outro tipo de incentivo perverso é focar em objetivos claramente mensuráveis, à custa de qualitativos,






porventura mais importantes. Um exemplo seria premiar pela quantidade de chamadas ou visitas efetuadas por um operador, não à qualidade do serviço prestado.

Ainda outro tipo de incentivo perverso é promover sistemas de avaliação que promovem a competição excessiva entre pessoas ou equipas internas, em detrimento da colaboração.

Se pedimos às nossas equipas que sejam inovadoras, mas castigamos o erro, limitando a experimentação, também podemos estar a incentivar perversamente.

É uma base do comportamento humano que nos movemos em direção a incentivos, fugindo de castigos. Buscamos o prazer, evitamos a dor. Isto faz com que os incentivos funcionem em todas as idades, mas também alimenta a criatividade na prossecução desses objetivos. Quem tem filhos sabe que, ao estabelecer uma regra, a criança com frequência encontrará o buraco para fugir: se for premiada por comer tudo o que está no prato, irá cuspir para o guardanapo ou sorrateiramente despachar comida para o prato de quem esteja ao lado.


















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Ter incentivos ao comportamento nas empresas é importante, e até vital para o sucesso, desde que tenhamos em conta, antes de os estabelecer, que potenciais efeitos indesejados podemos estar a potenciar.

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