No passado mês de dezembro foi publicado o Novo Código da Propriedade Industrial, em Portugal [1]. Este Código entra em vigor no próximo dia 1 de julho, com exceção da proteção dos segredos comerciais, que já está em vigor desde o passado dia 1 de janeiro.
Foram diversas as alterações relevantes introduzidas, no entanto, apenas iremos analisar uma destas e que diz respeito ao uso da marca registada.
Assim, quando uma marca é registada ®, em Portugal [2], o seu titular obtém um exclusivo sobre uma identificação/designação comercial para uso em certos produtos ou serviços no mercado português.
Sem a obtenção do ® não se poderá afirmar que a marca é de alguém. No entanto, obter o ® também não significa que, a partir daí, não haja mais nada a ter em atenção!
Com efeito, quem tem a marca ® deve utilizá-la, colocando-a nos produtos ou identificando os serviços para os quais está ®. Uma marca sem uso pode ver o seu ® caduco.
Quais os principais motivos, então, que obrigam alguém a fazer uso da marca®?
O ® destina-se a salvaguardar o interesse individual, mas tem também de ter presente o interesse público.
Para alguém que obtém o ® da marca, este dá-lhe a possibilidade de resguardar e defender a imagem da sua atividade e dos seus produtos no mercado, bem como de todo o esforço e investimento associados.
Tem-se ainda entendido, em regra, que os interesses da promoção da inovação, da concorrência, e ainda da maior escolha dos consumidores, são mais bem perseguidos com a atribuição de ® de marcas e o surgimento no mercado de diversas marcas de diferentes concorrentes. Quantas mais marcas ® entrarem e atuarem no mercado, mais serão as probabilidades do dinamismo empresarial e do aumento da concorrência - daí resultando potenciais vantagens para a escolha dos consumidores. É, portanto, também de interesse público a existência de marcas ativas no mercado.
Deste modo, a salvaguarda daquele interesse individual e a realização dos mencionados interesses públicos apenas se realizam na medida em que esteja a haver da parte do titular (ou de alguém autorizado) um uso ativo da marca ® no mercado.
Mas o uso da marca ® requerido não é qualquer uso, devendo obedecer a alguns requisitos importantes. Deverá ser, basicamente, um uso sério no mercado português - pois pressupomos que o ® da marca é em Portugal.
Por um lado, a marca não deverá, em princípio, ser usada com uma imagem diferente daquela que tenha sido ®. - E este aspeto é importante, pois, mais tarde, o rebranding da marca implica muitas vezes a obtenção de novos ®, não se compatibilizando com os ® já existentes.
O princípio da imodificabilidade da marca é a regra, neste domínio, prescrevendo a lei [3] que a “marca deve conservar-se inalterada, ficando qualquer mudança nos seus elementos sujeita a novo registo. “(…) excetuam-se as simples modificações que não prejudiquem a identidade da marca e só afetem as suas proporções, o material em que tiver sido cunhada, gravada ou reproduzida…”.
Na prática, muitas vezes, não é fácil saber-se quando se está a usar corretamente uma marca, ou quando se deve fazer um novo ®. Portanto, em muitos casos, a análise caso a caso e de forma técnica especializada é, mais do que oportuna, recomendável.
Por outro lado, aquele uso sério implica também que a marca ® seja usada efetivamente no mercado nos produtos ou serviços para que foi ®. Neste ponto, realça-se a colocação da marca ® no próprio produto ou em etiqueta ou rótulo associados ou identificando os serviços, bem como nos respetivos documentos de comercialização e publicidade. Trata-se de elementos muito importantes para a confirmação posterior do uso efetivo no mercado.
E esse uso efetivo deverá ainda realizar-se de maneira seguida, sem interrupções por períodos que ultrapassem o legalmente exigido – a não ser que exista um justo motivo que o impeça e que seja alheio à vontade do seu titular.
Portanto, uma marca que não seja usada no mercado, nos termos agora descritos, e que possa estar esquecida ou intencionalmente colocada na “gaveta”, não se adequa nem se compatibiliza com o acima descrito.
Se assim acontecer, pode ser declarada a caducidade do ® da marca, possibilitando-se que outro agente económico possa pedir o ® da mesma (ou semelhante) e possa utilizá-la na sua atividade, identificando os seus próprios produtos ou serviços.
Tendo presente isto, o que até agora foi mencionado, em jeito de contexto, é importante e o novo Código prevê estas soluções da mesma forma que o anterior.
Qualquer marca ® atualmente já está sujeita a estas regras e pode ter estes riscos se não estiver a ser usada. Mas, então, o que há de novo?
O novo Código dá mais relevância ao uso da marca (ou à sua falta) e às suas consequências práticas para o titular da marca ®.
Com efeito, se assim podemos dizer, o titular vê-se ainda mais obrigado a usar a sua marca, sob pena de não poder reagir contra certas situações, caso não consiga fazer prova do uso sério (ou de justo motivo).
Essas situações dizem respeito, sucintamente, a casos em que (1) o titular pretenda reclamar contra novos pedidos, a outras situações em que (2) um novo pedido de ® é recusado provisoriamente por causa de marca anterior, e ainda a situações em que se (3) pretenda a anular uma marca ® com fundamento noutra ® já existente.
Assim, na primeira situação, sempre que alguém reclame para defender o seu ® de marca, pode vir a ser obrigado a fazer prova daquele uso sério. Se não o fizer, a sua reclamação será indeferida [4].
A segunda situação surge no caso de uma recusa provisória do pedido de marca, motivada pela existência de marca ® anterior. Também nesta hipótese, o titular da marca anterior pode ser notificado para vir provar o uso sério desta - e isto apesar de não ter reclamado.
Se não vier ou não conseguir provar (ou justo motivo), a nova marca será concedida – podendo esta ser igual ou semelhante à anterior!
Contudo, nestas duas primeiras situações, para que o titular da marca ® seja obrigado a provar o uso é necessário que (1) a sua marca esteja ® há mais de 5 anos e que (2) seja solicitado expressamente a prova do uso sério.
– Note-se que, independentemente do resultado da prova, não está em causa a apreciação da caducidade da marca ®. Ou seja, é sempre necessário um processo de caducidade para esse efeito [5].
Por último, quanto à terceira situação, em que alguém pretenda anular uma marca ® posterior à sua, que também está ® - e já vimos que podem suceder existirem duas marcas iguais ou semelhantes ® - então, quem solicitar a anulação poderá também ser obrigado a provar o uso (sério) da sua marca, nos termos acima referidos.
Estas novas soluções, foram concebidas à imagem da solução já implementada no ® da marca da União Europeia.
Em termos práticos, quem tem uma marca ® terá de ter mais atenção. Caso não esteja a usá-la no mercado, ou a use com alterações relevantes, poderá ser o momento de ponderar se tem interesse em manter o ® ou de fazer um novo ®.
Não usando (seriamente) a marca ® poderá não conseguir impedir ou reagir contra o ® de novas marcas, que podem ser idênticas ou mesmo semelhantes à sua!