4 de Agosto de 2021




FINANÇAS







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PEDRO AMENDOEIRA

Partner na Expense Reduction Analysts

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MANUEL VELAZQUEZ

Partner na Expense Reduction Analysts

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GERARDO MOLLEDA

Analista na Expense Reduction Analysts





O mercado de eletricidade em 2021 e o cavalo chinês


O comportamento dos mercados energéticos nos últimos meses lembra-nos um conto tradicional chinês:

 



Um homem tinha um cavalo do qual gostava muito. Um dia o cavalo fugiu. Todos os seus vizinhos lhe disseram “que pena, que azar”, ao que o homem respondeu “veremos”. Passadas umas semanas, o cavalo voltou, trazendo uma bonita égua com ele. Os vizinhos disseram “que sorte”, ao que o homem respondeu “veremos”. O seu único filho, um saudável e forte jovem, ao montar a égua, caiu e partiu uma perna. Uma vez mais, os vizinhos lamentaram o ponto baixo da família e o homem respondeu de novo “veremos”. Passados uns dias, o exército entrou na povoação, recrutando à força todos os homens jovens, levando-os para uma guerra, onde a morte era quase certa, exceto o filho, justamente porque tinha a sua perna partida.



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ecentemen­te, os mer­ca­dos ener­géti­cos tive­ram os preços mais baixos e mais altos desde que há registo comparável. A cada ponto alto, o sentimento dos vizi­nhos, refletido nos mer­cados de futuros, indica que a alta está para durar. Por outro lado, a cada ponto baixo parece que a baixa será eterna. Se há uma coisa certa nos mercados, é apenas que mudam.

Como o homem do conto, não sabemos com segurança o que o futuro nos pode trazer. Podemos analisar o com­por­tamento dos merca­dos, a­pren­der com suas mudanças e estar preparado para reagir das formas mais adequadas.

Neste artigo vamos ver como se comportaram os mercados energéticos nos últimos meses, que pistas nos podem dar para as mudanças que se seguem e as estratégias para não sofrer com as mudanças inevitáveis.

Os preços da eletricidade de Espanha e Portugal são definidos num mercado comum, similar a um leilão constante, no qual os produtores de energia vendem blocos horários aos muitos comercializadores. No bolo em venda (o pool) entram com prioridade as renováveis (eólica, solar, hidráulica) e depois as tradicionais (nuclear, gás, carvão, petróleo).

Ainda que o mercado português seja 4 vezes menor que o espanhol, os preços são negociados conjuntamente e são muito similares, distando quando muito uns cêntimos por megawatt.

O mercado de leilão spot chama-se OMIE e pode ser consultado em www.omie.es. Há depois um mercado de futuros, no qual se transacionam direitos de compra e venda nos próximos meses e anos. 

Isto permite aos comer­cia­lizadores de energia fixar preços para o todo ou parte dos consumos que vendem aos seus clientes. Estes preços podem ser consultados em www.omip.pt.

O ano de 2020 foi o mais barato desde que há registos comparáveis. Durante a primeira fase da pandemia, em abril de 2020, graças à sobreprodução eólica, a um gás muito barato e à baixa de procura, o mercado afundou, com uma média de 17 €/MWh. Depois do verão, a procura voltou a valores próximos ao pré-Covid, vol­tando a cotizações próxi­mas dos 40 €/MWh. A procura de energia acumu­lada no con­junto do ano de 2020 acabou 5,1% abaixo da de 2019.

Estes preços tão baixos durante todo o 2020, sobretudo entre março e junho, permitiram a quem tivesse preços variáveis que pagasse a eletricidade muito barata. Permitiu também que fosse compensador em muitos casos rescindir con­tratos com os comercia­lizadores, pagando as pena­lidades definidas, e fixar preços num momento baixo.

2021 iniciou em alta. Depois de um fevereiro barato, graças a grande quantidade de geração renovável, em março iniciou uma subida de mercado que se manteve em abril, maio e parece continuar. A subida do gás e a imparável promoção dos direitos de emissão de CO2, que afeta toda Europa foram as causas.

Motivada por preocu­pações ambientais, a União Europeia implementou em 2005 um sistema de emissão de gases, que penaliza os produtores de acordo com suas emissões. Porque uma parte importante da eletricidade produzida na Península Ibérica é proveniente da queima de produtos fósseis (46,6 % em 2020), esta penalização tem reflexo nos preços finais.

Nos últimos anos têm havido mudanças na normativa europeia que pressionaram os preços do intervalo de 5 a 10 euros por tonelada, em que estavam até 2018, a mais de 56 euros/ton a que chegaram em meados de maio de 2021. Estes direitos de emissão de CO2 continuam o seu inexorável caminho de subida. É pouco provável que os preços destes direitos baixem significativamente no futuro, a menos que hajam de novo mudanças na legislação europeia, desta vez de sentido inverso.

Ainda que de um modo geral contratos longos na energia não sejam muito desejáveis, é em momentos em que os preços estão muito baixos que se devem fazer. No ano de 2020 existiram oportu­nidades muito interessantes para fixar preços, que são pouco prováveis que se repitam num futuro próximo.

Se existisse uma palavra que pudesse definir o compor­tamento dos preços em 2021, seria “instabilidade”. Como no conto chinês com que iniciámos este artigo, a subidas rápidas seguiram-se fortes baixas. No global, duvidamos que 2021 possa ser um ano barato em termos energéticos, embora possa acontecer que toda a instabilidade origine períodos curtos de baixa, nos quais poderia compensar fixar preços, incluindo a um período algo mais longo.


























À pergunta “que se segue?” a resposta mais sábia será a mesma que deu o homem do conto: já veremos.


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