ANTÓNIO NOGUEIRA DA COSTA

CEO da efconsulting |  docente e membro do N2i do IPMaia

Liderança Empreendedora


O bom governo de uma organização deve considerar qual a preponderância do perfil do seu líder - gestor ou empreendedor - e, consequentemente, ao assegurar a sua sucessão, deve também ter presente esta dualidade, que nem sempre se encontra na mesma pessoa, mas que pode ser complementada numa equipa.




A perenidade, um dos maiores desejos das famílias empresárias para as empresas familiares que controlam, é indissociável da continuidade da sua liderança, levando a que o processo da sua sucessão não seja um desafio, mas uma oportunidade. O bom governo de uma sociedade deve considerar dois distintos perfis de timoneiros, a saber:

  • Líder Gestor: preocupa-se com o curto e médio prazos e os aspetos mais operacionais, acrescentado valor à sua execução, e que são vitais para a estabilidade e a sustentabilidade da empresa familiar;

  • Líder Empreendedor: foca-se no longo prazo e impulsiona a inovação, o posicionamento e o crescimento dos negócios para enfrentar as procuras futuras do mercado;

e percecionar se os mesmos estão calibrados de acordo com as exigências do mercado onde está inserida a sociedade. Se a condução for assegurada por uma só pessoa, é 

importante que esta tenha presente as duas perspetivas referidas; se for por duas ou mais pessoas, esse equilíbrio também deve ser assegurado, podendo ser alocado a distintas pessoas.

Também nas empresas familiares as abordagens e características de um líder gestor e de um líder empreendedor aportam impactos distintos, tanto para a gestão diária quanto para a visão de longo prazo. Embora ambos possam ser eficazes, as suas prioridades e os seus estilos de liderança tendem a divergir em alguns pontos fundamentais, cujas principais diferenças são:

1- Foco Estratégico

• Líder Gestor: Foca-se em preservar e melhorar o que já foi estabelecido, priorizando a continuidade, a eficiência e a estabilidade da empresa. A ênfase é colocada na otimização de processos, no controle de custos e na manuten­ção da rentabilidade, numa perspetiva voltada para a gestão do presente.

• Líder Empreendedor: O empreendedor tende a ser movido pelo crescimento e inovação. Procura

explorar novas oportunidades, diversificar o portefólio de produtos e serviços, entrar em novos mercados e está disposto a correr mais riscos para expandir os negócios. A sua visão está orientada para o futuro a que a empresa pode chegar.

2- Abordagem ao Risco

• Líder Gestor: Prefere uma abordagem cautelosa e avessa ao risco, com foco em previsibilidade e segurança. Este perfil tem tendência a tomar decisões baseadas em dados, análises minuciosas e históricos de (in)sucesso, para garantir que a empresa se mantenha sólida e segura.

• Líder Empreendedor: Adota uma postura mais aberta ao risco, frequen­temente explorando ideias e oportuni­dades de alto impacto e, por vezes, alto risco. É mais propenso a experi­mentar, inovar e aceitar o fra­casso como parte natural da apren­di­zagem, o que pode trazer grandes ganhos, mas também desafios financeiros.

3- Tomada de Decisão

• Líder Gestor: A tomada de decisão é estruturada e baseada em processos.



O gestor valoriza as cadeias de comando e geralmente consulta outros líderes e gestores antes de decidir, com o objetivo de mitigar incertezas e reduzir erros.

• Líder Empreendedor: A decisão é rápida e impulsionada por intuição. Esse tipo de líder tem uma visão mais ágil e toma decisões frequentemente baseado em perceções e tendências. A estrutura tende a ser mais flexível e a hierarquia menos rígida, incentivando autonomia e inovação.

4- Orientação para Processos vs. Inovação

• Líder Gestor: Prioriza a padronização e o controle de processos. Procura estabelecer regras, políticas e procedimentos claros para assegurar a qualidade e a consistência, o que é crucial para empresas que desejam manter uma operação estável e assegurar a perenidade.

• Líder Empreendedor: Enfatiza a criatividade e a inovação. Está constantemente em busca de novas formas de resolver problemas e de trazer novidades para o mercado. O erro é uma oportunidade de aprender e um incentivo à experimentação.

5- Gestão de Pessoas e Cultura

• Líder Gestor: Tende a ser um gestor de talentos, focado em manter a equipe motivada e produtiva dentro de uma estrutura mais tradicional e previsível. Valoriza a estabilidade e busca pessoas que se alinhem bem com processos estabelecidos, podendo ter mais aversão à rotatividade.

• Líder Empreendedor: Incentiva a autonomia e a inovação dos colaboradores e, frequentemente, procura atrair talentos com perfil criativo e resiliente. Costuma criar uma cultura de trabalho mais dinâmica e aberta, onde são incentivadas ideias

novas e a aprendizagem é constante.

6- Sustentabilidade e Expansão do Negócio

• Líder Gestor: Foca na sustentabilidade e preservação dos recursos, sendo cuidadoso ao expandir o negócio e dando prioridade ao fortalecimento das operações existentes. As suas principais estratégias visam manter a rentabilidade e a saúde financeira da empresa no longo prazo.

• Líder Empreendedor: Está mais disposto a apostar na expansão e na diversificação dos negócios lançando novos produtos, entrando em novos mercados ou criando unidades de negócio independentes. Essa abordagem pode gerar rápido crescimento, mas também um risco maior.

7- Resiliência em Crises

• Líder Gestor: Por ter processos


estabelecidos e uma estrutura estrutura sólida, é mais preparado para manter a empresa estável durante crises económicas ou imprevistos. A sua postura mais conservadora ajuda a empresa a resistir a dificuldades com menos mudanças drásticas.

• Líder Empreendedor: Tem uma resiliência criativa, identificando soluções inovadoras e ajustando a direção do negócio com rapidez em situações de crise. Embora possa correr mais riscos, geralmente tem uma flexibilidade que permite reagir de forma ágil e encontrar novas fontes de receita.

8- Relacionamento com Clientes e Mercado

• Líder Gestor: Privilegia preservar relações e atender bem os clientes atuais, assegurando que eles recebam o mesmo padrão de qualidade e confiabilidade. É orientado pela fidelidade e satisfação dos clientes já conquistados.

• Líder Empreendedor: Está em constante busca de novos mercados e segmentos de clientes e procura novas oportunidades para expandir o alcance da empresa. Foca-se mais em tendências e mudanças do que nas preferências dos consumidores.

9- Legado Familiar e Visão de Longo Prazo

• Líder Gestor: Geralmente privilegia preservar o legado da família e proteger os valores tradicionais da empresa. A sucessão e a continuidade são aspetos fundamentais e o gestor procura assegurar que a empresa mantenha a sua essência e reputação.

• Líder Empreendedor: Embora também valorize o legado, considera a adaptação e a reinvenção como partes importantes desse legado. A prioridade é tornar a empresa competitiva e relevante, mesmo que isso signifique mudar substancialmente sua identidade ou seus processos originais.

Neste contexto de dualidade de perfis, o processo de preparar a sucessão e a transição na liderança da empresa familiar, deve considerar etapas como:

1. Avaliar as Competências e Capacidades dos Sucessores

Começar por uma análise profunda das competências, pontos fortes e aspirações dos familiares que possam



ser candidatos à liderança. Se alguns membros tiverem atratividade por outras áreas, não se deve forçar a sua dedicação à empresa, pois pode ser prejudicial tanto para ela quanto para a empresa.

2. Estabelecer Critérios de Seleção

Definir critérios claros e objetivos para a escolha do sucessor, como qualificações profissionais, experiência prática no setor e competências em liderança, ajudará a legitimar a escolha, tornando-a menos subjetiva e reduzindo conflitos familiares.

3. Criar um Plano de Desenvolvimento para o Sucessor

Uma vez identificado um sucessor potencial, o mesmo deve ser preparado para assumir responsabilidades gradualmente. O processo pode incluir formação, estágios em diferentes áreas da empresa e, se possível, experiência noutras empresas para ampliar as suas perspetivas.

4. Estruturar um Processo de Transição

A transição deve ser planeada e comunicada para que todos entendam o processo e as suas etapas. Um plano

de transição gradual, que inclua um período de coexistência, em que o líder atual e o sucessor trabalhem em conjunto, é benéfico para garantir que o conhecimento e a experiência sejam adequadamente transferidos.

5. Considerar a possibilidade de um Conselho de Administração

Se a empresa ainda não tem um, a criação de um conselho de adminis­tração pode fornecer uma base sólida de governo para orientar o novo líder e complementar as suas valias. O conselho pode incluir familiares e profissionais externos para assegurar a objetividade nas decisões.

6. Definir o Papel do Líder Atual Após a Transição

Muitos fundadores ou líderes sentem dificuldade em se afastar completamente da empresa. Definir claramente o papel e as responsa­bilidades do líder atual (posição consultiva por ex. º) pode ajudar a evitar atritos e ambiguidade e facilitar ao sucessor o assumir a liderança em pleno.

7. Comunicar a Mudança com Transparência

A sucessão deve ser comunicada



de forma clara e com antecedência aos empregados e outros stakeholders da empresa, salientando que a empresa está preparada para um novo capítulo e que preservará os valores e a visão que a sustentaram até ao presente.

8. Preparar a Família para o Processo

A sucessão pode gerar conflitos, que podem ser menorizados se todos 

os membros da família estiverem alinhados e cientes da escolha, evitando disputas e ressentimentos.

9. Focar na Cultura e na Visão de Longo Prazo

Por fim, reforçar os valores e a cultura da empresa para que continuem a ser um suporte às atuações do sucessor. Será também essencial que 

ele conheça a história e a missão da empresa para liderá-la com autenticidade.

Conhecer o perfil do atual líder e qual deve ser o do sucessor e encetar um plano de sucessão adequado, embora seja um processo delicado é essencial para a sustentabilidade da empresa e para o fortalecimento do legado familiar ao longo das gerações.




O João Carvalho nasceu em Belmonte, na Quinta dos Termos, é casado com Lurdes e tem dois filhos. Foi colega de carteira de Sócrates no liceu da Covilhã, antes de se licenciar em engenharia têxtil da Universidade da Beira Interior e chegar a CEO da Fitecom e empresário agrícola, sendo o maior produtor de vinhos DOC da Covilhã. Aprendeu a ser empreendedor no início da adolescência, quando os pais lhe atribuíram uma parcela de terra que ele trabalhava para assegurar o seu sustento. 

 Na conferência “Desafios das Empresas Familiares”, realizada a 18 de outubro, participou numa mesa-redonda, neste regresso à UBI, onde sobressaiu o seu perfil de líder empreendedor - aprecia criar projetos e empresas e depois entregar a sua gestão corrente a outros que o fazem muito melhor.

O seu percurso profissional reflete este seu posicionamento. Após a licenciatura trabalhou na Sofal, de onde saiu em 1989, exerceu funções de docente na UBI, entre 1990 e 2008 (a tempo parcial para permitir desenvolver os seus projetos) e, em 1993, com mais dois sócios, comprou em hasta pública os ativos da fábrica de lã onde trabalhou – que tinha sucumbido por obsolescência tecnológica - e fundou a Fitecom (FIação, TEcelagem e COMercialização).

Apostou na inovação nos acabamentos, sendo pioneira no país na utilização de acabamentos ao nível da nanotecnologia e no desenvolvi­mento de novas fibras adequadas a novos tipos de utilização (anti-odores, anti-stress ou que reagem à 



temperatura), o que a levou a  conquistar marcas como a Hugo Boss, Armani ou Valentino e a exportar totalidade da produção com cerca de 80% para a Europa e o resto do mundo a ficar como restante.

Na década de 1990 iniciou a digitalização do processo produtivo, com os primeiros sistemas CAD, e, nos últimos anos, tem intensificado a utilização de ferramentas digitais para a criação e venda de produtos. Possui um parque fotovoltaico que a torna praticamente autónoma durante o dia. 

As suas irreverências levaram-no também a transformar a Quinta dos Termos, há três séculos nas mãos da família, com cerca de 180 ha e uma área vinícola em produção de 54 há, no maior produtor da região com Denominação de Origem Controlada da Beira Interior.




A sua receita de sucesso: tecnologia, investimento e exportação.






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