Projetemos antes cenários (3 ou 4) dentro dos contextos que nos são importantes e antes de definir um “plano” para cada um deles, é importante definir o que cada um deles vai exigir de nós como Pessoas (emoções, forma de estabelecer relações e know-how).
Em 2019, vários especialistas de algumas áreas como commodities, meteorologistas, inovação, etc. estavam relutantes em prever algo para além de 400 dias. Porquê? Porque nos últimos 5 a 10 anos, grande parte do mundo deixou de ser complicado e passou a ser complexo — o que significa que sim, há padrões, mas que não se repetem com regularidade. Significa que pequenas mudanças podem causar um impacto desproporcionado. Significa que a experiência nem sempre será suficiente, porque o ecossistema continua a mudar muito rapidamente.
Hoje o Mundo é Complexo e Líquido. É um Vulcão.
Num ambiente que desafia tanto as previsões, focarmo-nos apenas na performance não só não nos ajuda, como especificamente mina e corrói a capacidade de adaptação e resposta.
Então, se a eficiência deixa de ser o nosso princípio orientador, como poderemos encarar o futuro? Que tipo de pensamento nos irá realmente ajudar? Talvez passar do Low Touch para o High Sense. Segundo Margaret Heffernan, enquanto no passado pensávamos muito na gestão “just-in-time”, agora temos de começar a pensar no conceito “just-in-case”, e prepararmo-nos para acontecimentos que, certamente, ocorrerão mas que se mantêm especificamente ambíguos.
Nesta entrevista recente dela, podes aprofundar o racional que está por detrás desta visão a qual subscrevo totalmente.
Reparei que estes dias são a prova provada que existindo um sentido de urgência comum, conseguimos auto organizarmo-nos de forma relativamente rápida. O mais impactante é este contexto promove uma autonomia individual que gera valor ao grupo porque o melhor de cada um de nós vem ao de cima automaticamente – o líder, o que age, o que investiga, o que motiva, o que imagina o futuro e riscos.
Ou seja, isto é tão esquisito e fascinante ao mesmo tempo – o caos parece que permite a criação orgânica das melhores estruturas. É como se nós, como Pessoas estivéssemos a colocar em prática os mecanismos das células e evolução que tanto mistério nos causa.
E essa prontidão, a construção de alianças, a imaginação, as experiências, a coragem — numa época imprevisível, são fontes tremendas de resiliência e força.
Não são eficientes, mas dão-nos capacidades ilimitadas de adaptação, variação e invenção. Quanto menos sabemos do futuro, mais iremos precisar destes tremendos recursos de competências humanas, desalinhadas e imprevisíveis.
Não vai dar para aguentarmos muito tempo nos ZOOMS e TEAMS da vida.
Até mesmo fisiologicamente não aguentamos porque como são ecrãs e interações dinâmicas, é como se estivéssemos 8 a 10 horas seguidas a jogar CALL OF DUTY ou FIFA. E eu sei do que falo.
Nos grupos de trabalho em que tenho participado até mesmo os mais ferrenhos nómadas digitais ou pessoas que sempre trabalharam de forma remota entendem que o modelo de trabalho que “criamos” para reagir a este contexto não será sustentável por mais algum tempo.
Eu já tenho um “fato de astronauta” e respetivos acessórios encomendados para o cenário de, no limite, apenas podermos estar juntos a trabalhar em formato “clean room”.
Esta “nova” dependência da tecnologia também é paradoxal. Por que nos protege e salva mas também inibe e “desempodera” as nossas competências emocionais e necessidade básicas como seres humanos como o toque, o cheiro, a cumplicidade e porque não as feromonas.
A dura e profunda verdade é que o futuro é desconhecido, que não o conseguimos mapear senão quando lá chegarmos.
Mas tudo bem, porque temos muita imaginação — se a usarmos. Temos profundos talentos de invenção e exploração — se os aplicarmos. Temos coragem suficiente para inventar coisas nunca vistas. Se perdermos essas competências, ficaremos à deriva. Mas, se as aperfeiçoarmos e as desenvolvermos, podemos ter qualquer futuro que escolhermos.
Então e o que fazer? Algumas sugestões práticas para desenvolveres o High Sense:
- Dedica tempo a refletires, criares e planeares coisas que provavelmente nunca serão necessárias
Isto
parece contraproducente numa altura que estamos focados em gerir o agora.
A questão é que muitas das dificuldades que passamos agora advém do foco
quase exclusivo na eficiência e não na agilidade perante a
imprevisibilidade. Alex Osterwalder tem uma abordagem interessante que
podes adaptar para o teu contexto ou desafio –
Explore and Exploit. Basicamente significa dedicar 10%
a 20% do nosso tempo e recursos a criar, criar e criar em modo Human, sem
esperar retorno.
2. Procura a Curiosidade
Precisamos de mais equipas dedicadas exclusivamente à exploração do que se passa à nossa volta. Não há nada nesta “quarentena” que te impeça de seres curioso, conversares, procurar sparring partners novos, fazeres questões, fazeres ____
cross-mentoring no sentido de desenvolveres relações, amizades, alianças fortes, sabendo que algumas delas poderão nunca ser usadas com um benefício direto. Explora as tuas atuais e futuras Realidades Laterais.
3. Aprofunda a Diversidade
Hoje em dia tens 30 mil palcos para poderes expressar a tua voz. Basta estares numa Zoom ou Webinar. Mas isso não chega. Para além da acessibilidade aos webinars, contribuis para a diversidade ao seres convidado para partilhar ou pertencer à reflexão, és incluído quando podes ter o teu espaço de voz e partilha e pertences quando a tua voz é de facto escutada e a tua mensagem interage e cria impacto de emocional, relacional e a nível de know-how nos outros.
4. Antes de seres Soldado, sê o General (Estratégia)
As competências estratégicas não estão muito desenvolvidas na grande parte dos profissionais. Porque estratégia, planeamento e implementação estavam segmentados por hierarquias, não por valor, comunicação e foco no cliente e nas pessoas. Nesse sentido desenvolve as tuas competências estratégicas criando cenários, não planos. Aqui podes ver um Scenario Map que desenvolvi no âmbito de um think tank internacional de Liderança e Estratégia onde contribuo e aqui tens um template em branco para poderes fazer a tua própria viagem de helicóptero. Atenção que é um exercício que requer transparência e olhares de frente para as coisas.
5. Impermanência & Aceitação
A Importância e Impacto da Aceitação da Mudança e do Vazio (ou perda do que estamos habituados ou achamos confortável) estão devidamente documentadas em várias práticas, filosofias e reflexões de corpo, mente e espírito milenares. Não tenho muito a acrescentar aí. J Mas penso que neste texto e também neste poderás ter uma ideia de como essas perspetivas nos podem ajudar a lidar com estes tempos exóticos no que ao Capital Humano e Desenvolvimento Organizacional diz respeito.
6. Ownership e Wholeness
É necessário um upgrade da nossa maturidade como Pessoas tendo em conta o que estamos a lidar. Não falo do binómio criança-adulto, falo sim de conseguirmos da melhor forma possível sentirmo-nos e sermos responsáveis pelas nossas decisões e ações, bem como sermos os nossos melhores amigos quando os resultados ou consequências não são aquelas que desejávamos ou ainda mais importante precisavam. Para isso temos que abraçar com a maior leveza e descontração possível o famoso Síndroma do Impostor.