27 de Maio de 2024






VÍTOR BRIGA

Formador de Criatividade e Comunicação




PAÍSES BAIXOS – O ENCONTRO DO ‘THE CULTURE MAP’






‘As diferenças culturais não devem separar-nos uns dos outros, mas sim trazer uma força coletiva que pode beneficiar toda a humanidade. Além disso, o diálogo intercultural é a melhor garantia de um mundo mais pacífico, justo e sustentável’ 


Robert Alan Aurthur




H

á cerca de dois anos, fui convidado por um antigo, e estimado cliente, um grupo hoteleiro português com mais de cem hotéis em vários países, a dar formação às suas equipas na Europa e no Estados Unidos. Este projeto formativo permite-me dar formação em Amesterdão, Londres, Berlim, Madrid, Barcelona e Nova Iorque. Um desafio fascinante, pois é a conjugação de duas das minhas paixões: a formação comportamental e a viagem.

Iniciei o projeto em Amesterdão com o entusiasmo de voltar a esta excitante cidade, desta vez em trabalho. Preparei toda a formação e materiais em inglês e, quando recebi a lista de participantes, apercebi-me de que iria ter em sala cerca de nove nacionalidades distintas de diferentes continentes. Não dei muita importância ao facto, pois para mim, nessa altura, o mais importante era perceber como poderia servir melhor as necessidades do cliente e refrescar o meu inglês para que o idioma não fosse um obstáculo.

Os cursos acabaram por correr muito bem, com participação bastante 



 

 

ativa e um interesse generalizado demonstrado pelos participantes aos temas e objetivos da formação. Guardo excelentes recordações destes dias e destas equipas.

No entanto, observei que as mesmas atividades, e a minha forma de dar feedback, suscitavam reações diferentes de acordo com a nacionalidade dos participantes, o que me fez pensar sobre a importância de adaptar a minha comunicação (e a leitura dos formandos) considerando as

diferentes culturas presentes numa sala.

Na viagem de regresso, enquanto fazia tempo no aeroporto, fui ver os livros que estavam nos escaparates de uma das livrarias e o título de um livro chamou-me a atenção: ‘The Culture Map – Decoding how people think, lead, and get things done across cultures’.

De repente, estava aqui a resposta para as minhas inquietações!



Erin Meyer, a autora, é reconhecida internacionalmente pelo seu trabalho no campo da comunicação intercultural e gestão global. É professora na INSEAD, uma das principais escolas de negócios do mundo, onde leciona sobre Gestão Intercultural e Comunicação Internacional.

Neste livro, explora as diferenças culturais no ambiente de negócios e oferece insights valiosos para líderes e equipas que trabalham em contextos multiculturais. Num mundo cada vez mais interconectado e diversificado culturalmente, o seu trabalho é um recurso valioso para todos aqueles que querem compreender e navegar nas complexidades da diversidade cultural na comunicação organizacional.

Meyer identifica oito dimensões culturais fundamentais que afetam a comunicação e a colaboração entre pessoas de diferentes origens culturais. São elas:

COMUNICAÇÃO COM BAIXO CONTEXTO VS. COMUNICAÇÃO COM ALTO CONTEXTO:

As culturas de baixo contexto tendem a comunicar de forma clara, direta e explícita, sem sentidos ocultos. Por outro lado, as culturas de alto contexto podem usar uma comunicação mais subtil, e não verbal, para transmitir mensagens e, portanto, devemos ler também o que não é dito, mas que se pode (e deve) deduzir pelo contexto;

FEEDBACK NEGATIVO DIRETO VS. FEEDBACK NEGATIVO INDIRETO:

Algumas culturas valorizam a expressão franca, frontal e aberta das opiniões, enquanto outras preferem uma abordagem mais reservada, diplomática e cautelosa na expressão do feedback negativo;

LIDERANÇA HIERÁRQUICA VS. LIDERANÇA IGUALITÁRIA:

Algumas culturas têm uma estrutura hierárquica rígida, onde a autoridade é respeitada e a comunicação flui de cima para baixo. Outras culturas têm uma abordagem mais igualitária, onde acreditam que



um bom líder é alguém que empodera os seus colaboradores e estabelece uma comunicação mais horizontal;

TOMADA DE DECISÃO CONSENSUAL VS. TOMADA DE DECISÃO ‘TOP-DOWN’:

Enquanto que algumas culturas valorizam a tomada de decisões em grupo e investem o tempo necessário para garantir que cada parte interessada concorda antes de a decisão ser tomada, outras acreditam que a decisão deve ser rápida e incisiva e, normalmente, tomada pela pessoa com poder hierárquico;

CONFIANÇA CONQUISTADA NA RELAÇÃO VS. CONFIANÇA CONQUISTADA NA TAREFA:

Algumas culturas acreditam que criar relações fortes é a chave para o sucesso nos negócios e preferem investir tempo significativo a criar laços pessoais e de confiança com os seu colegas e clientes. Para outras, a confiança é ganha pela competência e, portanto, preferem dedicar o menos tempo possível à relação, apenas o necessário para que a tarefa seja efetuada o mais rápido e eficazmente possível;

CONFRONTACIONAL VS. EVITAMENTO DO CONFRONTO:

As culturas confrontacionais consideram o desacordo como algo positivo e encorajam a equipa a ver as diferentes perspetivas do assunto, estão confortáveis com o debate e com o conflito de ideias. Por outro lado, existem culturas que veem a confrontação como algo negativo, que vai causar mal-estar e problemas relacionais e, como tal, preferem evitar o conflito a todo o custo;

TEMPO LINEAR VS. TEMPO FLEXÍVEL:

Estrutura, organização, planeamento e ser pontual é muito valorizado em algumas culturas, enquanto outras preferem a flexibili­dade e a improvisação, colocando em segundo plano o respeito pelos planos ou a pontualidade;

APLICAÇÕES PRIMEIRO VS. PRINCÍPIOS PRIMEIRO:

Culturas com baixa tolerância à ambiguidade preferem estruturas e processos claros. Nestas, devemos começar por apresentar factos, aplicações práticas e só depois os conceitos em que se baseiam essas conclusões. Outras preferem conhecer primeiro as teorias e os conceitos complexos de base antes de lhes serem apresentadas soluções.

Convido-vos a analisar o mapa de Portugal nestas oito escalas:

Além de conhecermos o nosso perfil, pode ser muito útil para o leitor que trabalha com diferentes culturas fazer mapas cruzados, isto é, usar esta ferramenta online – ‘The Country Mapping Tool’ – para inserir as nacionalidades dos diferentes interlocutores com quem vai estar numa reunião ou projeto. 




Isso permite antecipar as diferenças e semelhanças que vai encontrar na equipa. Veja, por exemplo, este mapa que compara a cultura neerlandesa com a portuguesa.

Para um português que vai trabalhar com um grupo de neerlandeses, várias conclusões interessantes podem ser retiradas daqui. Perceber, por exemplo, que, tratando-se de uma cultura que prefere um feedback negativo direto, dá-me a liberdade de ser mais frontal e transparente quando for necessário; permite-me também, por outro lado, interpretar eventual feedback que receba como franqueza cultural e não como algo pessoal.



Claro que, como todas as categorizações, o trabalho de Erin Meyer deve ser aplicado com bom senso, pois podem haver variações significativas dentro de cada população, nomeadamente diferenças regionais e individuais, e também as cada vez mais relevantes questões geracionais.


Contudo, a descoberta do ‘The Culture Map’, que aqui partilho convosco, e a minha experiência a trabalhar em diversos países e contextos multiculturais, ensinou-me a saber distinguir melhor aquilo que é pessoal daquilo que é cultural, a suspender o meu julgamento, a não saltar imediatamente para conclusões, a fazer mais perguntas, a ouvir melhor antes de falar, a estar mais atento às pessoas e, acima de tudo, a usufruir do fascínio que é a diversidade cultural, num mundo cada vez mais globalizado.










Percebi também que, apesar de ser importante adaptar-me às diferentes culturas, devo manter sempre a minha autenticidade, pois é na complementaridade das diferenças, e daquilo que cada um tem de único, que todos podemos ganhar.










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