12 de Agosto de 2025


MANUELA RIBEIRO

Consultora e criadora da metodologia THE CHOICE – service awareness


Ética em Ação: Crescimento com Consciência em Tempos de Incerteza


Os tempos mudaram e a transparência na gestão das empresas é algo cada vez mais importante para o seu posicionamento no mercado.



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urante muito tempo, a ética foi vista como algo acessório, era importante, mas num papel secundário, relativamente à eficiência, ao crescimento e à rentabilidade. Hoje, essa lógica está claramente a ser desafiada por um novo paradigma de desenvolvimento: mais humano, mais consciente e mais equilibrado.

Neste cenário, a ética passou a ser um ativo estratégico e estrutural para as empresas que querem evoluir de uma forma sustentável e não apenas sobreviver. Num âmbito mais alargado dos 3 Ps – Profit, People, Planet, surgem temas como:

- Os relatórios ESG, que convidam as empresas a partilhar os seus níveis de performance, ambientais, sociais e de governance para além do tradicional desempenho financeiro;

- A iniciativa internacional dos IDG – Inner Development Goals, que incentiva o desenvolvimento de competência interiores dos colaboradores das empresas, com vista a uma atuação mais consciente e

responsável, orientada para o desenvolvimento sustentável.

Neste contexto, a ética tem um papel fundamental no crescimento sustentável, tentando encontrar um equilíbrio no qual as pessoas estejam em harmonia consigo próprias, com os outros e com o planeta.

Nesse sentido, o lucro (Profit) considera o impacto que os negócios têm sobre as pessoas (People) e o planeta (Planet), afastando-nos assim da lógica linear e passando a trabalhar os negócios de uma forma sistémica, numa lógica de agir para o bem de todo o sistema (Go for the good of the all).

O modelo dos 3 Ps propõe um caminho mais equilibrado para crescer, sem desconectar o desempenho económico da responsabilidade social e ambiental. Nessa equação, a ética pode ser percebida como o ponto de convergência entre as três dimensões.

E como integrar essa visão ética de uma forma concreta e profunda? É neste ponto que a iniciativa dos Inner Development Goals (IDGs) — o conjunto de competências humanas, considerado como fundamental para

lidar com os desafios globais e contribuir para implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) - pode ajudar.

Os IDGs reconhecem que a transformação externa começa com uma transformação interna e que liderar de forma ética, requer que os líderes e as organizações reforcem o desenvolvimento de capacidades como autoconsciência, empatia, pensamento crítico, colaboração, coragem e persistência, entre outras.

A partir desta visão dos IDG, podemos construir 5 Cinco Dimensões da Ética nas Organizações:

1. SER (Being) – A ética como identidade e coerência

A ética organizacional tem como ponto de partida o autoconhecimento. Quem somos como pessoas individuais? Quem somos enquanto organização? Quais são os nossos valores reais — e não apenas os que são mencionados como declaração de missão no website da empresa? - O quanto é que esses valores são clara­mente comunicados e toda a organi­zação envolvida na sua prossecução?


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a ética passou a ser um ativo estratégico e estrutural para as empresas que querem evoluir de uma forma sustentável e não apenas sobreviver.

Quando existe clareza na identidade e propósito das empresas, elas são mais coerentes nas suas decisões, principalmente nos momentos de crise ou pressão. Nesses momentos elas colocam a pergunta que cria a diferença – “Esta ação serve o nosso propósito?”

Atuar ao nível do Ser significa investir em lideranças conscientes e disponíveis para reflexão, criar espaços de diálogo interno, programas de desenvolvimento humano e ambientes seguros, para refletir sobre os desafios e tomar decisões a partir de uma visão generativa e não reativa. Em simultâneo criar as condições para que as decisões sejam efetivamente implementadas – quantos planos já foram desenhados em conjunto, mas nunca passaram à implementação?

2. PENSAR (Thinking) – Decisões a partir de uma visão crítica e sistêmica

A ética fica mais forte quando pensamos além do imediato, além do curto prazo, porque incorpora pensamento crítico, análise de consequências e responsabilidade ampliada. 

Dessa forma é possível identificar decisões financeiras, que apesar de serem vantajosas no curto prazo, podem comprometer algumas relações comerciais, reputação ou impacto ambiental.

Ao integrar princípios ESG, métricas de impacto e ferramentas de avaliação de risco ético, as organizações conseguem alinhar o lucro a uma visão sistêmica de longo prazo. 

A ética pode funcionar assim como um filtro estratégico, que evita decisões reativas e incentiva as decisões generativas.

3. RELACIONAR (Relating) – Ética nas relações humanas 

A ética é fundamental no processo de relacionamento. A forma como tratamos os nossos colaboradores, parceiros, clientes e comunidades reflete a profundidade ética da nossa cultura organizacional.

Um relacionamento com todos os stakeholders, baseado na apreciação, na empatia, no sentir-se ligado ao outro, contribui para criar sistemas mais justos e sustentáveis para todos. O princípio de que um negócio só faz sentido, quando todos ganham, pode ser construído a partir desta visão, garantindo que o outro é valorizado como um sujeito e não apenas como mais um recurso.

4. COLABORAR (Collaborating) – As soluções construídas em conjunto

No mundo atual, hiper conectado e interdependente, a ética é fundamental para que a colaboração aconteça. Os grandes desafios exigem respostas de igual dimensão e as parcerias fazem a diferença na procura de soluções. As empresas éticas conhecem o poder da colaboração, o quanto a partilha de esforços consegue criar efeitos de alavancagem significativos, pelo que, estas empresas procuram alianças com outros setores, promovem inovação aberta e participam em ecossistemas geradores de impacto.

Esta colaboração ética, sustentada pela transparência, pela partilha de poder e por uma visão comum é capaz de gerar soluções mais criativas e sustentáveis, para além de fortalecer comunidades e até regenerar sistemas. 

5. AGIR (Acting) – A coragem e o compromisso ético

Colocar a ética em ação é conseguir aplicar cada uma das dimensões anteriores, ao longo de toda a cadeia de valor de um negócio, sabendo que por vezes isso vai exigir a tomada de decisões difíceis, mas é esse assumir de posições claras e manter a coerência, mesmo quando perante situ­a­ções com elevados níveis de stress e pressão, que vai evidenciar um verda­deiro compromisso com a mesma. 

Alguns exemplos desta ação ética podem ser o terminar contratos com fornecedores, que violam direitos humanos, o assumir um compromisso público com metas climáticas e o corrigir erros com responsabilidade e total transparência sobre os mesmos.




A ética em ação consegue fortalecer uma marca, reforçar a confiança junto de clientes, fornecedores parceiros e comunidade, criar mais motivação nas equipas, reter talento e atrair investidores que compartilham os mesmos valores.

A modos de conclusão, ética, crescimento e desenvolvimento, não são conceitos mutuamente exclusivos - pelo contrário, o verdadeiro crescimento sustentável, só é possível quando a ética ocupa o centro das decisões.

Este “centro” leva-me a partilhar uma talk inspiradora de Tim McCartney em 2010, sobre o Children’s Fire https://www.youtube.com/watch?v=1JchSac-VP0, baseada numa prática dos povos nativos norte-americanos. Segundo esta tradição, nenhuma decisão dos órgãos de poder, deve ser tomada sem garantir o bem-estar das crianças da geração atual e das gerações futuras.

Estamos no caminho, a complexidade atual coloca inúmeros desafios de vária ordem, mas esta visão ética dá suporte a Escolhas deste tipo - Go for the good of the all – e só estas escolhas serão capazes de garantir um futuro equilibrado, para as crianças de hoje e de amanhã. 


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